Algumas reflexões e
impasses junto aos alunos
fazem pensar certas coisas de outros modos.
Paranoia. Este é
o estado no qual se encontra as pessoas atualmente. Nas metrópoles – e isso não
diz respeito somente à São Paulo – e também nos grandes centros de poder e decisão, em
suma, no atual estágio do capitalismo, as pessoas, os Estados, as relações
sociais são, em estado de exceção – e isso que surgiu na conversa com os alunos
de modo bem trivial e reflexivo –, todos eles psicopatas por excelência. Em
estado de exceção, sim, já que “é como prevenção que se deve ser paranoico”. Os ataques discriminatórios, que julgam por “conceito-pré-conceito”,
são sempre frutos de uma paranoia imanente e naturalizada. Não é mais um luxo
dos usuários de crack ver “bichos” os perseguindo. Atravessar a rua para se "prevenir" de um assalto ou de um estupro, correr depois das 22h para fugir
sabe-se lá do quê, não conseguir olhar aos olhos de outro sem tremer
(principalmente à noite), denunciar e acusar, são estados “normais” em vista da
“sobrevivência” do indivíduo. A “guerra sem baixas” do século XXI, como já
apontam alguns pensadores, é exatamente a guerra de prevenção. Os bombardeios
de 2002 ao Afeganistão e a derrubada de Saddam Hussein não indicam isso também?
A H1N1 não criou um estado paranoico no mundo? E, logo, algumas pesquisas
revelaram que a gripe “normal” derrubava mais gente que a tal “peste do século
XXI”.
Se a histeria foi
o grande boom da virada do século XIX
para o XX, esse estado de exceção que se torna regra e traz em seu bojo o
pânico é o que nos circunda e perpetra. O “grande irmão” – as câmeras
espalhadas pelas cidades testemunham muito bem isso –, que nos acossa e nos “protege”,
é, de fato, a luz do progresso e nossa “segurança em plenitude”: Minority Report é um grande exemplo. Aquilo
que José Serra disse em entrevista à CBN, ano passado na corrida das eleições,
não era isolado nem espasmos de sua loucura individual: trata-se de um
processo. Segundo ele, era (ou melhor: é) necessário identificar potenciais
criminosos juvenis nas escolas públicas municipais (e blá blá blá). Esse tipo
de pensamento reacionário não era, nem é, isolado: ele retrata o “ZeitGeist” – o “Espírito do Tempo” –, aquilo que já se tornou senso comum no
imaginário e agora está tomando forma na linguagem, advindo publicamente e com
força. A redução da maioridade penal não é fruto da “paranoia preventiva”? Um
estado de coisas paranoico e violento – sociopata – reduz o processo de advento
das contradições sociais a um único ponto: eliminação do imediato. É óbvio que
o trabalho ideológico junto ao senso comum nem precisa ser tão intenso, já que
extenso e se desenrola no tempo, encaixado quase que perfeitamente no decorrer
histórico. Além do problema latente que é a luta de classes – no qual só os “mais
escuros” e os “menos providos” que irão ser o alvo imediato –, há o problema do
transtorno compulsivo social. É aqui que a inumanidade real atinge a si
própria, em nome da “vida” e da “paz”, com a morte.
A paranoia real,
que insufla a “vida” de cada um todos os dias e faz com que desconfiem de tudo
e todos, reiterando, não é mais um luxo dos “noias clássicos”; não é mais uma exceção.
E isso está tomando forma de morte na medida em que tende a eliminar o seu
anverso: o outro deve deixar de existir, seja ele quem for. Não é esse o
discurso neo(nazi)pentecostal? Não é esse o discurso dos “moderninhos
alternativos” que, porventura, somente aceitam o “seu” diferente? Não é, também, a prática cotidiana cínica, que “existe
racismo, mas ninguém é racista”, que elimina o racismo ao eliminar o objeto
(eliminando e incorporando – suprassumindo – seu cabelo, seus modos
tradicionais, suas músicas e etc.)?
Quando estiver
andando e sentir a necessidade de atravessar a rua por conta de um “potencial
estuprador/bandido/marginal”: cuidado, você faz parte (e toma parte) dessa
inumanidade mortífera.
Subsolo Urbano!
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