quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A TOTALIDADE SOCIAL CAPITALISTA: FETICHE DA PRODUÇÃO

A combinação social do trabalho alienado dentro do contexto capitalista faz com que a produtividade, as capacidades de trocas, em suma, a relação social seja domínio pleno do movimento do capital. A troca de trabalho vivo por trabalho objetivado que se dá na produção é a expressão da vontade abstrata da coisa. Esta coisa – o capital, trabalho morto – surge com força consciente, mesmo em sua inconsciência. É o poder para determinar as relações, desde a própria produção, que institui e constitui a formação social capitalista. Há, aqui, a inversão fetichista da produção: o objeto torna-se sujeito, determina as relações; os indivíduos, isolada ou coletivamente, são momentos coisificados dentro do processo. Estes indivíduos são determinados pelo movimento autônomo do objeto, aquele do qual fazem parte na produção. Desse modo, partindo da combinação social que tem o capital como sujeito, “a desapropriação do poder produtivo do trabalhador ocorre no próprio processo de produção” (NEGT & KLUGE, 1999, p. 104).
Assim sendo, o capital, como “potência econômica da sociedade burguesa, potência que domina tudo(MARX, 1993, p. 107), aparece no processo de trabalho de acordo com suas relações específicas. Não somente como material e meio de trabalho, aos quais pertence o trabalho e incorporando a si mais trabalho para a valorização do próprio capital. Juntamente à anexação do trabalho, o capital absorve as combinações sociais daí surgidas. Tais combinações, tanto objetivas quanto subjetivas, expropriadas do trabalhador individual e coletivo, desenvolvem-se como forças estranhas que dominam o trabalhador. Estas forças são propriedade imanente do capital. O conjunto deste movimento surge como um processo social específico. Os fins particulares dos indivíduos e suas vontades conscientes estão subsumidos à totalidade do processo. Este aparece, em sua efetiva objetividade, como natural. Mesmo que a produção social surja da interação entre indivíduos supostamente conscientes, ela não os pertence. E esta mesma interação produz um poder social combinado, estranho, independente e situado para além das consciências e poderes individuais e combinados dos Homens. Dessa forma, o capital adquire objetividade auto-determinada, transformando-se em sujeito na medida em que configura mais sua coisidade, por ter incorporado o trabalho e as determinações sociais como seus momentos. Sua forma de existência, neste sentido, é de uma autonomia efetiva face aos indivíduos. É no processo produtivo alienado que o capital a adquire. Oskar Negt e Alexander Kluge, no texto O trabalhador total, criado pelo capital com força de realidade, mas que é falso, mostram que esse poder do capital engendra-se no ato da produção. Segundo o texto:
O capital, à medida que subtrai da força de trabalho socialmente produtiva uma das sínteses que partem dele, institui uma combinação, com poder de realidade, da força de trabalho social. O capital não incorpora apenas o trabalho social, portanto, mas também as combinações sociais da força de trabalho, que se acumulam diante do trabalhador individual sob a forma de poderes sociais. (NEGT & KLUGE, 1999, pp. 104-5).
É o capital em si e para si que possui realidade e determina todos os momentos da totalidade social a partir da produção alienada. Desse modo, o fetiche da mercadoria, aquele objeto que aparece como sujeito após seu desligamento dos produtores, é somente a aparência, a superfície do processo produtivo fetichizado. Não é o produto acabado que se mostra alheio aos indivíduos, assim como a alienação não ocorre após a produção, relativo ao objeto pronto e exteriorizado. É, antes, o processo produtivo que coordena a si mesmo e independe totalmente das vontades e poderes individuais. Assim, o processo produtivo do capital é movimentado por si, em sua plena autonomia. Marx enfatiza e explicita o caráter de tal processo:
mais complicada, porém, e aparentemente mais misteriosa torna-se a relação, à medida que, com o desenvolvimento do modo de produção especificamente capitalista, essas coisas – esses produtos do trabalho, enquanto valores de uso e também valores de troca – não apenas ganham vida e se defrontam com o trabalhador na condição de capital, mas também se apresentam à forma social de trabalho como formas de desenvolvimento do capital e, por conseguinte, apresentam as forças produtivas do trabalho social, assim desenvolvidas, como forças produtivas do capital. Enquanto forças sociais produtivas elas são capitalizadas em face do trabalho. De fato, a unidade comunitária na cooperação, a combinação na divisão de trabalho, a aplicação das forças naturais e das ciências na maquinaria opõem-se ao trabalhador singular como algo estranho, objetivo, como um dado. Elas parecem meras formas de existência dos meios de trabalho dominantes e que delas são independentes, desde que eles apareçam objetivamente e incorporem a visão encarnada no capitalista ou em seus representantes e os anseios do ateliê em seu conjunto. As formas sociais de seu próprio trabalho – subjetivo/objetivo – ou a forma de seu próprio trabalho social são relações formadas de modo totalmente independente dos trabalhadores singulares; os trabalhadores, subsumidos no capital, tornam-se elementos dessas formações sociais, e não pertencem a ela. Assim, eles se opõem a elas como configurações do próprio capital, como combinações que – diferentemente de seu poder de trabalho isolado – pertencem ao capital, combinações que dele surgem e que a ele estão incorporadas. E isso, por um lado, assume uma forma um tanto mais real quanto mais seu próprio poder de trabalho é tão modificado por essas formas que se torna impotente em sua autonomia fora desse contexto capitalista; quanto mais, portanto, sua capacidade de produção independente é quebrada; por outro lado, com o desenvolvimento inclusive tecnológico da maquinaria, as condições de trabalho surgem como o trabalho dominante e, ao mesmo tempo, o substituem, reprimem, tornam-no supérfluo em suas formas independentes. (MARX apud NEGT & KLUGE, 1999, pp. 105-06).
A imagem de um trabalhador total que se apropria da produção, que é “essência de todas as atividades produtivas”, não é possível no contexto capitalista. Nas sociedades onde o poder social combinado não pertence à produção, isto é, naquelas ditas pré-capitalistas, a diferenciação, dando-se poder às classes produtivas e tomando-se as classes estéreis como desnecessárias, faz sentido. Contudo, na formação social burguesa, a aparência do poder produtivo pertence às classes dominantes. “Surge a aparência objetiva, fundamentada no próprio modo de produção, de que a classe dominante seja a única classe produtiva da sociedade.” (NEGT & KLUGE, 1999, pp. 103-04). Mesmo assim, apenas como aparência. No capitalismo, a produção é engendrada e subsumida ao movimento abstrato do capital. Na primeira expressão, o trabalhador total combinado ou o corpo social do trabalho aparece como o sujeito que domina e o autômato mecânico como objeto; na outra, o próprio autômato é sujeito, e os trabalhadores são coordenados aos órgãos inconscientes como órgãos conscientes, e subordinados junto com aqueles à força motriz central. Os trabalhadores singulares são membros de um organismo que trabalha. Surge a cooperação independente da consciência do indivíduo. Não obstante, fica-se impossibilitada a apropriação desse trabalho total por parte dos indivíduos. “Para o trabalhador total parece totalmente fora de controle tudo aquilo que os participantes singulares tentaram controlar durante toda a sua vida. Nesse sentido, trata-se aqui de uma abstração real, concreta, independente do pensamento.” (NEGT & KLUGE, 1999, p. 111). A primeira expressão vale para qualquer uso possível da maquinaria em grande escala; a outra caracteriza o seu emprego capitalista e por isso o moderno sistema de industrial. O fetiche do capital faz com que ele próprio apareça como o “demiurgo do mundo moderno”, “centro organizador da produção, compreendendo todas as atividades sociais e [...] transformando-as em atividades produtivas.” (NEGT & KLUGE, 1999, p. 104). O poder de apropriação do trabalho total é do capital. Ele que institui o trabalhador total, tomando para si todas as capacidades produtivas dos indivíduos isolados. Aquele trabalhador total, composto pela totalidade dos indivíduos produtores, na sociedade capitalista, é desprovido de realidade, falso, posto pelo capital como um de seus momentos de efetivação. Segundo Negt e Kluge:
fora do contexto capitalista, o poder social de trabalho dos produtores é impotente, sua capacidade autônoma de produção é quebrada. Embora seja objetivamente a fonte do valor e da mais-valia e, por conseguinte, fonte também do capital – a base substancial da sociedade, portanto –, ele parece, como afirma Marx, subjetiva e objetivamente desprovido de realidade, impotente, como mera função do capital, que representa o verdadeiro sujeito da síntese e da produtividade. (NEGT & KLUGE, 1999, p. 106).
Neste âmbito, o trabalho direto do proletariado está circunscrito ao capitalismo, onde constitui um momento do capital, mesmo que contraposto a ele. A classe trabalhadora, desprovida de autonomia, é essencial para sua produtividade, não sua negação. Dessa forma, o capital, segundo Giannotti (1984, p. 114), necessita de duas condições para sua plena realização: “de um lado o trabalho livre, propriedade do trabalhador, passível de ser comprado a dinheiro, de outro a separação desse trabalho das condições objetivas de sua realização, a saber, a destruição das formas de propriedade em que o trabalhador se apropria dos meios de produção como se fossem seu corpo inorgânico.”. Consideram-se, na presente interpretação, as classes sociais essenciais ao capitalismo – capitalistas e trabalhadores – “não como sendo os criadores da sociedade capitalista, mas como suas criaturas.” Elas não são “atores da sociedade capitalista, são agidas por ela.” (JAPPE, 2006, p. 90). A classe trabalhadora, diferente do que se afirmou durante todo o século XX, supostamente contraditória ao capital, não é sujeito da emancipação humana, da suprassunção do capitalismo. Por outro lado, os capitalistas também não são os efetivos dominantes do processo produtivo. Eles não “dirigem a sociedade seguindo a maldade de uma vontade subjetiva de explorador” (GRUPO KRISIS, 1999, p. 25). São, contudo, personificações do capital, mera aparência concreta da dominação abstrata. Somente detêm o poder por esse meio. São subsumidos ao movimento automático da produção, assim como os trabalhadores, embora de forma diferenciada. Do mesmo modo, Marx afirma que
uma vez que o trabalho vivo – com a troca entre capital e trabalhador – se incorpora ao capital e aparece como atividade a este pertencente desde o início do processo de trabalho, todas as forças produtivas do trabalho social passam a desempenhar o papel de forças produtivas do capital, do mesmo modo que a forma social geral do trabalho aparece no dinheiro como propriedade de uma coisa. Assim, a força produtiva do trabalho social e suas formas particulares se apresentam então na qualidade de forças produtivas e formas do capital, do trabalho materializado, das condições materiais (objetivas) do trabalho – as quais, nessa forma independente, em face do trabalho vivo, se personificam no capitalista. (MARX, 1987, s/ página).
O fetichismo aparece como inversão real, expressa na produção social, com o capitalista aparecendo como encarnação do caráter social do trabalho alienado e da grande indústria. Isto revela que o conflito entre capital e trabalho, entre burguesia e proletariado é intrínseco ao capitalismo e tende a ser, também, superado com a suprassunção do modo capitalista de produção. “Trabalho assalariado e capital mais não são do que dois estados de agregação da mesma substância: o trabalho abstrato coisificado em valor. São dois momentos sucessivos do processo de valorização, duas formas do valor.” (JAPPE, 2006, p. 94). O capitalista e o operário assalariado, em si, são simplesmente a encarnação, a personificação do capital e do trabalho alienado. As classes sociais existentes nesse processo não passam de executoras da lógica das componentes do capital. Marx, neste sentido, diz que “o capitalista funciona unicamente como personificação do capital, o capital enquanto pessoa, da mesma maneira que o operário mais não é do que o trabalho personificado.” Por conseguinte, a dominação de classes é a aparência do real domínio da “coisa sobre o homem, do trabalho morto sobre o trabalho vivo, do produto sobre o produtor”, um processo “que, decerto sob um ângulo, nos mostra, num dos pólos, o capitalista tão submetido ao capital quanto o operário, no pólo oposto” (MARX apud JAPPE, 2006, p. 90). A unicidade entre trabalho e capital, essa unidade contraposta que forma a produção social capitalista, que se personifica no trabalhador alienado e no capitalista, ambos desprovidos de realidade, compõe a totalidade efetiva do capitalismo.
Isto demonstra que a análise marxiana não recorre a tachar o capitalista como ‘mau’, não carrega em si nenhuma conotação moral, já que o próprio capitalista, como personificação do capital, determinado por este, só age como tal por ser peça da engrenagem a qual ele mesmo não gira. “O funcionamento estrutural do capitalismo não está ligado à ‘sede de lucro’ nem à ‘rapacidade’ de um grupo social.” Contudo, “os detentores do capital não são vítimas inocentes: prestam-se muito interessadamente a desempenhar o papel que lhes cabe. Mas não são capazes de controlar um processo que é impulsionado pelas contradições internas” dessa sociedade (JAPPE, 2006, p. 91). Logo, os capitalistas estão submetidos à autovalorização tautológica do capital. Capital e trabalho, portanto, são momentos reflexivos de uma relação social total, presidida pelo processo produtivo capitalista.
O capitalista, neste sentido, caracteriza-se apenas como expressão imediata da dominação social. Por trás deste imediatismo, o capital aparece como o grande dominador da sociedade, inclusive da burguesia que, supostamente, controla o processo. Não há um sujeito dominante nesta sociedade, tampouco um sujeito histórico que carrega em seu bojo a superação dela. No entanto, o fetichismo, caracterizado por Marx, admite a existência efetiva de um sujeito, mas ele não é composto pelos Homens, nem são eles mesmos. São, antes, suas relações objetivadas. Os indivíduos, assim, aparecem subordinados à produção. Tanto trabalhadores assalariados, quanto capitalistas são momentos integrantes do movimento autônomo da coisa. A teoria marxiana da inversão fetichista assume que o verdadeiro sujeito é o capital, trabalho morto, e que o Homem não é mais do que o executor de sua lógica. “Aos homens, a sua própria socialidade e a sua subjetividade surgem-lhes submetidas ao automovimento automático de uma coisa.” (JAPPE, 2006, p. 92). Ainda assim, deve-se frisar que não são propriamente as coisas que reinam sobre os indivíduos e as classes, mas só o fazem na medida em que subsumem as relações sociais, isto é, somente quando estas se objetivaram nas próprias coisas. Neste sentido, a história da formação do sujeito no capitalismo
não é primordialmente a história de uma substância que é sujeito em formação, mas antes de um sujeito formado e em automovimento – o capital, ‘sujeito automático’ [...] – que impõe o trabalho como ‘um fim em si mesmo’. Um sujeito que se erige a partir das relações sociais reais, só que autonomizadas e transfiguradas em ‘curso das coisas’. Uma ‘razão’, enfim, que forma um ‘mundo’ [...], cria uma cultura [...] e uma civilização material, produz seu espaço, determinando a realidade e a consciência de classes como seus ‘suportes’ funcionais (DUARTE, 1999, p. 4).
Os Grundrisse caracterizam explicitamente o capital como substância que se move por si mesma e que é o sujeito social. Sugere-se, assim, que existe de fato no capitalismo um sujeito histórico, não o identificado com algum grupo social, como o proletariado, nem com a humanidade. Marx analisa-o, sobretudo, em termos de estrutura das relações sociais, estrutura esta constituída por trabalho objetivado e captada pela categoria capital. Tal sujeito é abstrato “e não pode ser identificado com nenhum ator social” (POSTONE, 1993, pp. 75-76): consiste-se em relações sociais reificadas. Segundo os Grundrisse,
essas relações de dependência objetiva também aparecem em oposição às relações de dependência pessoal (a relação de dependência objetiva nada mais é do que as relações sociais que enfrentam de modo autônomo os indivíduos aparentemente independentes, isto é, suas relações de produção recíprocas autonomizadas diante deles mesmos) de maneira que os indivíduos agora são dominados por abstrações, enquanto antes dependiam uns dos outros. Porém a abstração ou idéia não é senão a expressão teórica daquelas relações materiais que dominam. [...]. Naturalmente, relações só podem ser expressas em idéias e assim os filósofos tomaram como característica da época moderna [o fato de] os indivíduos serem dominados pelas idéias, e identificaram a produção da livre individualidade com a derrubada dessa dominação das idéias. O erro era do ponto de vista ideológico tanto mais fácil de cometer, porque aquela dominação das relações (aquela dependência objetiva que de resto se transforma em relações de dependência pessoal determinada, só que despida de toda ilusão) na consciência dos indivíduos aparece como dominação das idéias, e a crença na eternidade dessas idéias, isto é, daquelas relações de dependência coisal é, é claro, reforçada, alimentada, e inculcada por todos os modos pelas classes dominantes. (MARX, 1993, pp. 164-65).
O fato está em que não é simplesmente uma abstração dominante, que determina a efetividade sem antes ter surgido dela: engendra-se na produção social. Tal abstração consiste em uma forma historicamente específica de interdependência, de caráter impessoal e objetivo. São, ainda, constituídas por formas determinadas de prática social e, além disso, tornam-se independentes das pessoas engajadas nessas práticas. Neste processo, “o resultado é uma forma de dominação social nova e crescentemente abstrata – uma forma que subordina as pessoas a imperativos estruturais impessoais e a restrições que não podem ser adequadamente captadas em termos de dominação concreta (isto é, dominação pessoal ou de grupo) [...].” (POSTONE, 1993, pp. 3-4). Além disso, essa forma efetiva de dominação é expressa no trabalho objetivado. Marx caracteriza tal dominação fundada no trabalho morto como força estranha ao trabalho vivo: a dominação, portanto, “está fundamentada na forma valor da própria riqueza, uma forma de riqueza social que contrapõe o trabalho vivo (os trabalhadores) a uma força estruturalmente alheia e dominante.” (MARX, 1993, p. 831). A abstração, portanto, consiste justamente na síntese da produção: a relação social capitalista. Não são as pessoas que a moldam; antes, são moldadas por ela. Ainda, no Manifesto do Grupo Krisis, fala-se do trabalho formador: “trabalho forma a personalidade. É verdade. Isto é, a personalidade de zumbis da produção de mercadorias, que não conseguem mais imaginar a vida fora de sua Roda-Viva fervorosamente amada, para a qual eles próprios se preparam diariamente.” (GRUPO KRISIS, 1999, p. 25). O trabalho, de tal maneira, ao invés de formar a personalidade dos indivíduos, enquanto experiência, forma a personalidade do capital no momento mesmo em que coisifica as pessoas ao seu próprio modo. Assim, no capitalismo o trabalho social não é somente o objeto de dominação e exploração, mas é ele mesmo o fundamento essencial de dominação.
Moishe Postone chama estas formas sociais impessoais de dominação abstrata. Esta dominação não apenas encobre o que foi visto equivocamente como as reais relações sociais no capitalismo, isto é, as relações de classe; antes disso, elas são as efetivas relações sociais – o capital como síntese – e estruturam a totalidade social. Seguindo as análises de Marx, fundadas nos Grundrisse e em O Capital, Postone expressa estas relações da seguinte forma:
na análise de Marx, a dominação social no capitalismo, em seu nível mais fundamental, não consiste na dominação das pessoas por outras pessoas, mas na dominação de pessoas por estruturas sociais abstratas constituídas pelas próprias pessoas. [...]. Desse modo, uma marca central do capitalismo é que as pessoas realmente não controlam sua própria atividade produtiva ou o que elas produzem, mas são, em última instância, dominadas pelos resultados desta atividade. Esta forma de dominação é expressa como uma contradição entre indivíduos e sociedade e constituída como uma estrutura abstrata. [...]. Esta dominação abstrata não somente determina a finalidade da produção no capitalismo, segundo Marx, como também sua forma material. (POSTONE, 1993, p. 30).
Diferentemente das relações de dominação pré-capitalistas, que eram de ordem pessoal, direta e concreta, aquela que ocorre no sistema regido pelo capital é resultado de categorias funcionais fetichizadas pertencentes ao movimento autônomo e peculiar da produção social. Neste âmbito, é o trabalho abstrato o cerne da sociedade capitalista: é por meio dele que se subsume a totalidade à produção de capital. Portanto, não se trata de uma dominação de classes, do proletariado pela burguesia. Tampouco a superação do capitalismo deve ocorrer com a simples tomada do poder pelos trabalhadores: o mesmo poder, apenas com outro sujeito reificado situando-se por cima da relação. Os próprios trabalhadores, isto é, o tipo de trabalho fragmentado, alienado e coisificado deve ser superado para a suprassunção efetiva desse sistema fundado na produção de valor e capital. Com isso, não é a mudança no modo como uma classe distribui a riqueza social – ou mesmo a alteração da classe que supostamente possui o poder de determinar a sociedade –, mantendo-se a estrutura fundamental fetichizada e subordinada à produção autônoma, que poderá efetivamente transformar a sociedade. Isto só faz alterar sua superfície. Neste domínio, somente com a superação do trabalho – consequentemente da produção fetichizada –, em todas as suas dimensões, que se poderá vislumbrar a supressão da dominação reinante.

REFERÊNCIAS

DUARTE, Cláudio Roberto. Introdução – O ponto aporético e sem retorno: as razões de um ‘Manifesto contra o trabalho’. In: GRUPO KRISIS. Manifesto contra o trabalho. Tradução de Heinz Dieter Heidemam e Cláudio R. Duarte. Coletivo Sabotagem, 1999, pp. 3-12.
FAUSTO, Ruy. Marx: Lógica e Política: investigações para uma reconstituição do sentido da dialética. 3º tomo. São Paulo: Ed. 34, 2002.
GIANNOTTI, José Arthur. O Ardil do trabalho. In: ___. Trabalho e reflexão: ensaios para uma dialética da sociabilidade. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1984, pp. 80-125.
GRUPO KRISIS. Manifesto contra o trabalho. Tradução de Heinz Dieter Heidemam e Cláudio R. Duarte. Coletivo Sabotagem, 1999.
JAPPE, Anselm. As aventuras da mercadoria: para uma nova crítica do valor. Tradução de José Miranda Justo. Lisboa: Antígona, 2006.
MARX, Karl. Grundrisse: foundations of the Critique of Political Economy. Tradução e prefácio de Martin Nicolaus. Londres: Penguin Books, 1993.
___. Maquinaria e Trabalho Vivo: Os Efeitos da Mecanização Sobre o Trabalhador. Traduzido por Jesus Ranieri. 2008. Disponível em:
. Acesso em: 26 mai. 2010.

___. Produtividade do Capital, Trabalho Produtivo e Improdutivo. 1987. Disponível em: <http://marxists.org/portugues/marx/1863/mes/prodcapital.htm>. Acesso em: 26 jul. 2010.
NEGT, Oskar & KLUGE, Alexander. O trabalhador total, criado pelo capital com força de realidade, mas que é falso. In: ___. O que há de político na política?: Relações de medida em política. 15 propostas sobre a capacidade de discernimento. Trad. João Azenha Júnior; colaboração Karola Zimber. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1999, pp. 103-34.
POSTONE, Moishe. Necessity, Labor, and Time: A Reinterpretation of the Marxian Critique of Capitalism. In: Social Research, Vol. 45, nº 4, winter 1978, pp.739-88.
___. Time, labor and social domination: A reinterpretation of Marx’s critical theory. Nova York: Cambridge University Press, 1993.
TAVARES, Maria da Conceição. O Movimento Geral do Capital: (um contraponto à visão da auto-regulação da produção capitalista). In: FIGUEIREDO, Eurico de Lima; CERQUEIRA FILHO, Gisálio; KONDER, Leandro (Orgs.). Por que Marx?. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1983, pp. 233-56.

Subsolo!

sábado, 7 de setembro de 2013

The Tribe Original Samples II


The Tribe Original Samples IIAqui, mais uma seleção. Não há muito que falar, a não ser que, diferente de antes, essa vai por caminhos mais funkeados, ou melhor, grooveados.
A Tribe Called Quest, como já disse muitas vezes, é um marco na história do Hip Hop. E também um marco na história dos samples: se procurar por Jazz, Funk, Soul, R&B e mais um monte de coisas – um monte de referências – encontrará por meio da A Tribe. Os sons aqui selecionados, são mais um pouquinho, mais uma amostra do que é esse universo. Enfim. Sons: da pesada! Pode fazer o down à vonts!


O disco se compõe da seguinte maneira: 
Artista  música [música da ATCQ referente]


The Tribe Original Samples II [2013]

01. The Last Poets – Time [Excursions]
02. Eugene McDaniels – Jagger the Dagger [Interludes]
03. Ohio Players – Pain [What Really Goes On]
04. The Meters – Hand Clapping Song [Clap Your Hands]
05. Lou Donaldson – Ode To Billie Joe [Clap Your Hands]
06. The Fatback Band – Wicky Wacky [Show Business]
07. James Brown & Fred Wesley – Damn Right I Am Somebody [Oh My God]
08. The Whatnauts – Why Can't People Be Colors Too [Oh My God]
09. James Browm – Funky Drummer [Separate Together]
10. Aswad – Not Guilty [His Name Is Mutty Ranks]
11. Brethren – Inside Love [Electric Relaxation]
12. James Brown – Funky President (People It's Bad) [Show Business & Oh My God]
13. Charles Wright & the Watts 103rd Street Rhythm Band – Fried Okra [Can I Kick It?]
14. Kool & The Gang  Give It Up [Scenario]
15. Jack McDuff – Classic Funke [Go Ahead in the Rain]
16. Clyde McPhatter – Mixed Up Cup [Lyrics to Go]
17. Lonnie Liston Smith – Spinnin Wheel [Buggin’ Out & Can I Kick It?]
18. Charles Wright & The Watts 103rd Street Band – What Can You Bring Me [Rock Rock Ya'll]
19. Kool & The Gang – Soul Vibrations [Scenario (Leaders of The New School) Remix]
20. Baby Huey – Hard Times [Can I Kick It?]
21. James Brown – Just Enough Foom For Storage [Lyrics to Go]