quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Barbárie expressa, não-contida, contemporânea...

... E quanto mais se olha para frente, mais desumano se torna. 

A mesmice! É o signo expresso da barbárie. Impactante, frustrante frente ao mundo, não é ler a Mínima Moralia e diagnosticar o presente pelo prisma do pessimismo. Antes disso, é no viver a realidade olhando-a pela "intentio oblíqua" que reside o 'soco no estômago', amargo da situação. Frustrante mesmo é ver que nem aqueles que se consideram com mais capacidade - ou mesmo aqueles que se admira - não conseguem se desenrolar do mundo, da lama e, por fim, caem na mesma poça, criticando, simplesmente e apenas, uma gotícula de água que saltou. A mesmice é a barbárie cotidiana, aquela na qual não se vê além do dado e naturaliza as bordas da realidade que, por isso, torna-se estanque. Os indivíduos reais não existem; aqueles que existem, são irreais. Tudo cai na redoma, no redemoinho que tudo suga da realidade fática. Aqui, pelo menos em aparência, tem-se a tão sonhada harmônia: underground e mainstream equacionam-se, igualam-se e, por fim, somem. O crítico de profissão e o 'reacionário' estão, ambos, no mesmo patamar: cumprimentam-se na fila do IPhone 5 (ou seja qual for o número). Tanto um quanto outro não concordam com o 'modelo de sociedade', criticam-na. A culpa, os defeitos são do outro - ou outro inexistente, diga-se - e, assim, lavam as mãos. Negam aquilo que perturba o sono; e, quando acordam, afirmam com toda força de seus parvos espíritos suas verdades sonhadas. O radical que come folhas e o canibal, 'alienado', encontram-se na fila do truste mundial, chamado supermercado, cumprimentam-se e, por fim, fazem reverência ao latifundiário. Aquele carro com adesivo da 'paz verde' utiliza etanol e, com ele, toda a superexploração do trabalho, e, ainda, para respeitar as 'leis' e o 'meio ambiente', tem dois carros: evita o rodízio. O que tanto defende animais assemelha-se a eles: perdeu o que tinha para além da selva, retorna a ela. Fala em desumanidade enquanto sonha possuir seu contrário: pula os 'lúmpens' na República, atravessa a rua e julga, como bom cristão, tudo e todos. No fim, todos se dão as mãos, glorificam o existente e expurgam quem e o quê 'sai da linha'. E, quando muito, suspendem seus "juízos morais" para, logo em seguida, dar aval para a chacina - talvez, não tão expressa. O que vale: ser integrante completo da mesmice, adquirir selo de qualidade, ISO não sei quantos mil, admirar o absurdo, saudar a barbárie. Saúdam-na quando se abraçam na frente do espelho, quando se admitem assim, como são. Quando, no mais, se debatem pelo mesmo. 

Subsolo!

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Sobre algo (e algoz)


No país que vale ser imbecil ou cínico (ou ainda, ambos), um novo tipo de fascismo – aquele dos herdeiros de senhor de escravos recalcados – bate à porta com toda força, mesmo que à espreita. Do lado de cá, aqueles que se isentam, por meio da arte retórica, da realidade – e até se esforçam muito para isso, fazem mestrado, doutorado, pós-doc na França e tudo mais! – criam uma outra realidade para si, a partir do umbigo. São aparentados à Alice. Ou mesmo, se  filosoficamente falando, à Montaigne – não, talvez, à sua teoria, mas à sua atitude de não descer de sua torre de marfim enquanto o mundo desaba. Aliás, desaba, desafiando as leis físicas: a torre continua em pé mesmo sem chão. Por um lado, o completo imbecil (que é ruim, problemático, proto-escravocrata de espírito e por coisificação), que alardeia sua pseudoparticularidade como um universal mal resolvido. Pernicioso por si só, pois encarna o “espírito do mundo” com toda força e sem restrições. Por outro lado, o cínico que, entre outras coisas, se isenta de tudo obliquamente. No entanto, o mais nocivo é o que abarca ambos em um só. Apesar de se isentar de tudo obliquamente, numa virada quase dialética, retorna, de sua isenção oblíqua, com os cantos dos lábios escorrendo baba espumenta de imbecilidade. Ele não leva o movimento da realidade em consideração e, em contrapartida, ataca-a funestamente com sua verdade imaculada. Sua posição, na torre, apolítica, é bem cinicamente política, por mais que despolitizada. Sua sagacidade acadêmica o faz desviar, em tentativa, de toda crítica da qual ele não consegue escapar: ataca, como um cão de quintal. Suas vontades particulares desfeitas, não feitas, contrariadas – assim como ocorre com a criança mimada que vive toda sua existência na primeira infância – ele berra aos quatro ventos seu descontentamento objetivamente cínico: é quase uma forma perfeita platônica, está para além da realidade e se posiciona como verdade  fora da esfera de atrito. Isso Gramsci já havia dito do intelectual tradicional. E enquanto seu posicionamento –  cinicamente imbecil, ou sua imbecilidade cínica – se dá para além da realidade, como falcatrua, impõe sua verdade de escravocrata recalcado (os mais cultos chamam reacionário) por meio do contato de sua baba espumenta raivosa com o público (que têm ouvidos, por mais que, como diz minha mãe, pareçam penicos). Que país é esse? Dizia alguém. É o país do imbecil, do cínico, e do intelectual babão que se preocupa com as mazelas da segunda guerra mundial e não consegue sequer debater 400 anos de escravidão (legal) e etc.. É o país no qual idiotice proferida por idiota, é idiotice; dita por intelectual é teoria. 

Subsolo!

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Vertentes Oblíquas II


Check the Rhime! Once again. São apenas 5 minutos para ler o texto: uma vida para fazê-lo. Na cidade onde as luzes são intensas – mesmo que inconstantes –, black birds sobrevoam sob a névoa. Só se quer algo tranquilo. Mais nada! The stakes is high, e não poderiam não ser. Aqueles que ousam, são insanos por natureza; os que não... Aqui ou em Paris. Não importa! É verdadeiro, de fato. O texto - it's fuck introduction -, é claro, pode parecer insano, mas desculpe, não resisti.

We’ve got Jazz, again!

Vertentes Oblíquas II: Jazz Rap [2012]

01. A Paris – Jazz Liberatorz
02. Introduction – Surreal & The Sound Providers
03. Check the Rhime – A Tribe Called Quest
04. Stakes is High (Jay Dee Remix) – De La Soul
05. How High (Freddie Joachim Remix) – Method Man & Redman
06. Ms. Fat Booty (Freddie Joachim Remix) – Mos Def
07. Stimutax (Freddie Joachim Remix) – Cypher Optics
08. Marie (Freddie Joachim Remix) – Choice 37
09. Too Nasty – ArtOfficial
10. 5 Minutes – The Sound Providers Feat. The Procussions
11. Rebirth of Skill – Surreal & Dj Balance
12. Me Desculpe Mas Não Resisti – Mental Abstrato Feat. Logics & NewSense
13. Insanos por Natureza – Primeira Audição
14. True Indeed – Surreal & The Sound Providers
15. Matter of Time (Freddie Joachim Remix) – Surreal
16. Where I’m From – Digable Planets
17. Just a Peace – Freddie Joachim
18. Hell No – Todd Sykes & EvergreenOne
19. Out of the Blue – Todd Sykes
20. City Hall - Todd Sykes & EvergreenOne
21. We Are – CityHall
22. Big City Bright Lights – ArtOfficial
23. They Reminisce Over You (T.R.O.Y.) – Dj Mitsu The Beats & Fat Loop
24. Rooftop – ArtOfficial
25. Black Birds – ArtOfficial
26. Jazz (We’ve Got) [Radio] – A Tribe Called Quest



Subsolo Urbano!

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Vertentes Oblíquas: Jazz Rap


We’ve got Jazz! É isso! Somente isso que define toda essa parada. O famoso refrão da A Tribe Called Quest que se tornou uma espécie de lema para o Rap a partir do início do novo milênio. E é disso que estamos falando aqui, Nigga!
A pequena compilação, que se pretende a primeira de uma série – pois tem muita coisa por aqui –, é fruto de uma pequena pesquisa e de uma grande experiência. Quando começo a pensar quando, exatamente, a música e o Rap entraram na minha vida, a memória viaja para longe. Mais ou menos 1992. São 20 anos de experiência. E naquele período não sabia – o que teria de saber? E quem saberia? – que o Rap me levaria por tantos e tantos caminhos; para tantos e tantos nomes; tantas e tantas pessoas bacanas, alguns irmãos que se fizeram nesses 20 anos. Nos rolês... E foi aí que conheci algumas pessoas incríveis. É claro que nem tudo são flores. Mas falemos somente delas aqui!
Foi pelo Rap que conheci o Jazz; e pelo Rap conheci o Funk; e também por aqui, as pessoas, os nomes... Foi, antes e maior que tudo, que me foi dado a possibilidade de criar uma identidade, muito diferente, pelo menos durante a década de 90, daquela que nos era imposta: aqui, identidade negativa. E negativa não como substância; mas como transitoriedade mesmo. O Rap das décadas de 80 e 90 formou uma geração. E uma geração de pretos pensantes, cientes e orgulhosos de si. Aqueles que têm o cabelo duro e sabem que isso é, antes de indicar a qual “grupo social” pertence, uma forma de auto-afirmar sua existência. Foi pelo Rap que conheci a Filosofia e a Teoria Crítica Social, pensando sempre em como “realizar” aquilo que as letras mais significativas nos diziam que era preciso. É, portanto, o fundamento de tudo.
Aqui o que se compilou foi uma “vertente oblíqua” dentro do escopo desses quase 40 anos de Rap, desde os finais da década de 70 até hoje. Uma “vertente”, pois, um fragmento que foge ao habitual dos anos 90 e anteriores. “Oblíqua”, pois vai além daquilo que vem à mente quando se ouve (ou quando se ouvia, no passado) a palavra Rap. Do início até o final da década de 80 a predominante influência do Funk se fazia visível em toda a extensão do “Movimento”. No entanto, no início dos anos 90 a coisa toma um rumo “oblíquo”: o Jazz entra em cena. O primeiro disco da ATCQ é, quase que totalmente, cheio de samples de Jazz. Basta observar que o primeiro disco, People’s Instinctive Travels and the Paths of Rythm, tem, nada mais nada menos, que 47 pedaços de músicas para compor os 14 sons do disco. O Funk não deixou de influenciar. Antes e além disso, o Jazz soma-se ao já sabido “beat” pesado. Outros grupos da década de 90 são influenciados por esse movement: Digable Planets, que abre o set, é um deles. Entre De La Soul, The Pharcyde e outros tantos, há algo que conflui, um nome: Jay Dee (ou J Dilla). Este é o cara. É ele o grande responsável por grande parte dos beats desse período. Enfim, o que vem depois, no novo milênio, em alguns casos leva em consideração apenas a aparência de todo esse momento anterior: talvez, em alguns casos, seja algo mais “industrializado”. Mas não deixa de ser bom ouvir e, tão pouco, deixa de ser bem feito. É Jazz Rap! É algo agradável aos ouvidos [e talvez esse seja um dos motivos de esse tipo de Rap ter sido incorporado aos “padrões” (ou “podrões”) dos valores da classe média branca].
Enfim, o que temos é algo bacana de ouvir. E, para quem quiser, aí está:

Vertentes Oblíquas: Jazz Rap [2012] 
01. It's Good to Be Here – Digable Planets
02. Intro – The Sound Providers
03. Hope (DJ Mitsu Remix) – Dj Mitsu  Feat. Pete Philly, Perquisite and Talib Kweli
04. Work It Out (Freddie Joachim Remix) – Freddie Joachim Feat. Mos Def
05. É Rimando que se Aprende – Primeira Audição
06. Mundo Cruel – Mental Abstrato Feat. Marcelo Monteiro & Ronaldo Camilo
07. Wake Up – Freddie Joachim Feat. Othello
08. The Field – The Sound Providers
09. Reflection – Freddie Joachim Feat. Choice37
10. That's Bad – Sinuous Productions
11. Bons Fluidos – Mental Abstrato
12. A Primeira Audição é a que Fica – Primeira Audição
13. Gone - ArtOfficial
14. What's Next – Jazz Liberatorz
15. Jazz (We've Got) – A Tribe Called Quest


We've Got Jazz! do Subsolo!


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Processo Político, Politização e Eleições


[NOTA: Prestes a mais uma eleição, resolvi escrever algo. Bem, minha perspectiva pode ser irrelevante para alguns, talvez não para os "espíritos livres", que abrem mão de suas doces e tranquilas cristalizadas opiniões, e tentam sempre rever o que há por trás de tudo que parece cristalino e cristalizado. Minhas opções políticas são mais "visíveis", inclusive para mim, após a longa reflexão que envolve esse texto. Aliás, reflexão, pelo menos sobre esse determinado ponto, que vem me perseguindo há mais de 3 meses. A opção, mesmo dentro do status quo reinante, que vislumbro, é esta: Toninho Vespoli 50650 e C. Giannazi 50. Ainda, dentro das limitações que o texto tenta tratar com algum rigor, vejo alguma possibilidade de mudança, algumas alternativas nos partidos de esquerda, especificamente o PSOL. É claro, cada um é "livre" - ao menos supõe-se isso - para concordar, discordar etc., da "opção" e do texto. Fica ao critério de cada "indivíduo que se quer autônomo". Ao menos, leia e um debate mais limpo talvez se iniciará.]

Processo Político, Politização e Eleições

A cada ano que se passa, principalmente os ditos “anos eleitorais”, sempre tento, num silêncio entronizado, compreender todo o processo político que ocorre no Brasil “pós-abertura”. Algumas discussões acaloradas sempre são bem-vindas para que pontos de vista sejam desfeitos, refeitos, modificados, deixados de lado; todavia, nunca concludentes ou mesmo concluídos. Em outras, as opções que os “debatedores” nos colocam são tão estreitas que beiram o autoritarismo, mesmo na falta de consciência – ou no cinismo oportunista – em torno do processo daquele(s) que as propõem. Claro fica que sempre há algo para além do dado; e qualquer reflexão não-preguiçosa ou acomodada consegue, ao menos, ir para além desse autoflagelo da discussão já vinda coisificada, pois imposta por argutos retóricos ou pelo senso comum que se faz como garrafa pet no meio do oceano. O que fica, por fim, é uma confusa ordem do pensar sobre a realidade que tenta, ao menos, achar um fio condutor para toda essa realidade efetiva lamentável – mas real! – que ora se apresenta.

Alguns pontos são interessantes serem notados, para que, ao menos, fique clara a proposta dessa exposição.

Uma cultura falsamente politizada do povo – e digo “povo” não apenas o dito “povão”, vai além disso – confunde debate político com a reprodução de discursos prontos, velados e autoritários pela forma. A forma é de tal modo massificada que engloba conteúdos diversos. As discussões nos âmbitos periféricos, menos “esclarecidos” (e há um motivo para as aspas), jogam dentro de uma fórmula de “sim e não”, dúbia, questões acerca de futebol, religião, novela até política-propagandística. É o mesmo processo que toma conta de tais discussões. Não importa tanto saber o conteúdo delas. É relevante apenas a forma, já que é aqui que se dá o tom da coisa. Na forma se posta todo o autoritarismo da razão coisificada, por um lado; e, por outro, um certo tom positivista que leva em consideração fatos geralmente isolados entre si e só conectados de maneira bruta. Além disso, a pseudo-politização, em um dos lados, se dá engendrada por uma noção peculiar de individualidade. Cada indivíduo – atomizado e fechado em si mesmo – tem a sua “opinião”, sendo sempre ela a “mais adequada” para si, a mais pertinente e diferente das demais já que é a expressão concreta de si mesmo, do indivíduo. O debate ocorre entre mônadas que se digladiam sem, no entanto, se relacionarem. Por extensão, o “indivíduo sabedor do mundo” e de seus desenvolvimentos é o indivíduo “entendido”, aquele que “sabe o que quer” e “sabe o que faz”. Ele, caso tomemos as eleições como parâmetro, vota sempre consciente de seu voto, assim como argumenta consciente sobre o desenrolar da novela e sobre o preço do tomate na feira de domingo.
Em “outra esfera da realidade paulistana”, estão, não menos convencidos de sua “superioridade”, os “grandes debatedores”, os pensadores da realidade efetiva. Sua politização desloca-se, na prática, de sua teoria. O mundo só é mundo caso limite-se ao seu bairro, “claro” e “esclarecido”. Tanto quanto o “esclarecimento periférico”, aquele de tom pequeno-burguês é esvaziado de sentido quando se leva em consideração a “opinião”. A diferença básica é que “sua opinião” está assentada num pedantismo intelectualesco e fixado na fórmula do “eu penso”, esclarecido por si só e fechado em sua redoma, PUCiana ou USPiana. Entretanto, ele sai da simples alienação da reprodução de discurso e vai para a esfera da suposta criação de pensamento. Mesmo assim, tal pensamento supostamente criado por sua individualidade suprimida, está dentro da mesma forma “esclarecida”, mesmo que sua condição lhe dê, ainda, certo conforto perante a miséria real. Aqui se abre o espaço para o ser reacionário, que pensa política com o umbigo, defende a meritocracia abstrata, a mesma que seus pais, mesmo tendo sido “críticos” da ditadura militar, defendiam, ainda que escamoteadamente. É aqui que se cria, por um lado, o arguto retórico cínico; e, por outro, o alienado político pequeno-burguês, seja ele o “radical” de algum nano-partido ultrarrevolucionário, ou o “intelectual liberal”, que se situa em sua condição de “livre pensador”, acima do bem e do mal. É aqui que ele, mesmo sem saber, utiliza da forma reificada do discurso: ou está acima do mundo, no céu do pensamento livre (e Marx diz isso sobre os “hegelianos de esquerda” nos Manuscritos), prostrando-se acocorado acima do povo incauto, e seu discurso empalado não passa nem de tangente sobre a questão que concerne à realidade efetiva; ou, de outro modo, está tão convencido de sua suprema sabedoria intelectualesca, que obteve no feudo chamado universidade, que, de um modo, a realidade é toda falsa, sendo apenas realidade aquilo que pensa e, de outro, “política é questão de opinião” (sendo a dele a mais elevada). Resumindo: um misto de cinismo e alienação pedante disfarçada.
Quando a forma toma o status de superioridade de assalto, moldando todo conteúdo, limitando o pensamento e a prática à reprodução, o indivíduo que “pensa” deixa de existir. Em seu lugar há uma classe que pensa por todos e, acima dela – e de todos os outros, por extensão –, uma coisa que pensa, funciona e se move livre em sua plenitude. Mesmo a classe supostamente dominante da sociedade apenas cumpre um papel legado pela estrutura fetichista dessa mesma sociedade. Ainda assim, a grande jogada da forma é assimilar, escamoteando, dominação e reificação à liberdade. O indivíduo é politizado, sabe sobre política; o que ele não sabe, e não precisa saber, é que seu conhecimento está assentado em um “todo falso”. A forma autoritária de democracia, aquela pela qual se lutou durante a ditadura, está posta sobre quem deve decidir (que, por sua vez, decide quem irá decidir por ele etc.). Todavia, esquece-se de se perguntar pelo como tal processo será levado a cabo. Quais os meandros, visto que a finalidade é “legítima”? E é exatamente nesse processo relegado que a forma do discurso impera livre e solta, fazendo-se valer plenamente.
A lógica, mesmo sendo uma “anti-lógica”, da ideologia não se dá quando força um conteúdo discursivo e prático tentando tomar a totalidade para si, criando um todo falso que se faz valer com valor de realidade. Ao contrário disso, ela se dá quando abre mão de todo conteúdo concreto e põe uma forma abstrata, que redireciona e conforma todo e qualquer conteúdo teórico-prático. Tanto esquerda quanto direita são condicionadas nesse frigorífico formal. Na prática política, especialmente na “disputa democrática eleitoral”, todo discurso, inclusive aquele de oposição, faz o mesmo jogo, respeitando as mesmas regras. As críticas, por exemplo, à Celso Russomano são tão batidas e impensadas que não rompem com o velho status do “fazer política”. Todas as “críticas” feitas não são relevantes em vistas da finalidade que tentam alcançar. Críticas à imagem e às propostas (ou à falta delas), feitas à direita ou à esquerda. Não mudam o status, já que aquele que vota, o indivíduo que “escolhe” candidato, é o mesmo que não liga para o processo – e está abstraído dele –, pois “sabe” que o todo é corrompido, sujo. Já que se tem de escolher, escolhe-se o “novo”: aquele que não é parte do velho e sem carisma dentro do âmbito político; tampouco aquele que está preso ao velho discurso, aos velhos símbolos e cores de sempre. Não se leva em consideração, no domínio popular, se fulano é corrupto, se é de direita ou esquerda, se tem projeto ou não. Além disso, assim como se viu na primeira eleição do Lula, é a propaganda (um misto de “indústria cultural” com “carisma do sorriso”), seu tempo de TV, entre outras mais, que é relevante. Eleger um candidato (ou eleger-se) é antes uma questão de imaginário, de inconsciente – assim como se dá ao comprar coca-cola relegando os refrigerantes X e Y que não têm força propagandística – do que uma questão de politização. O discurso popular – “todos são iguais” – é contraditório por si só: isso se vê na prática cotidiana. A anti-forma da lógica é mais favorável quando afirma do que quando nega. O discurso supostamente “denunciante” das mazelas de candidato X ou Y não tem mais força persuasiva. A forma é a mesma. Não nega nem afirma, apenas simula.
Não obstante, duas análises merecem destaque. A primeira, do professor Vladimir Safatle, “O conservadorismo filho bastardo do lulismo”, de agosto de 2012, e a segunda de Eliane Brum, “Russomano e a vulgaridade do desejo”, de setembro de 2012. Ambas, cada uma a sua maneira, vão para além da limitação do fato, do dado. Postam-se como alternativas teóricas a um fenômeno que se tornou “normal”. Um dos “poréns”, é que todo mundo torna mais forte, ao rebaixar, o “fenômeno Russomano”. A forma que se tem é que se deve tentar partir de um caso, de um ponto que foi colocado como decisivo pela ideologia. Ainda assim, mesmo a análise histórica sendo quase sem precedentes e bem assentada, a passagem de um ponto – o indivíduo reduzido ao consumo (o consumo como “dessublimação repressiva”) e o defensor do consumidor – a outro, como se fossem centrais, é, de certa maneira, “forçada”. O indivíduo “eleitor”, de fato, é aquele que consome e se vê beneficiário da massificação como democratização do crédito. Contudo, supor que essa lógica seja traçada nesses termos na consciência – ou mesmo na inconsciência, no imaginário – do povo, é ir para além da capacidade política desse mesmo povo. É interessante pensar teoricamente, pelo menos por um dos lados, desse modo. Só que é igualmente importante levar em conta que isso extrapola a capacidade político-individual reificada da população paulistana, que por tantos anos foi forjada sob o ferro do reacionarismo prático.

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A política é um jogo. E dentro desse jogo há regras. E dentro dessas regras existem limites, teóricos e práticos. Basta lembrar, como ponto central, que uma transformação política, mesmo como emancipação, não é sinônima de emancipação humana. E isso Sobre a Questão Judaica, de Marx, lembra-nos bem. Inserido dentro de regras e limites e, além disso, tendo-se uma estrutura fetichizada, autônoma perante os “indivíduos pensantes” estejam eles “por cima da carne seca” ou não, a política não passa de um âmbito no qual podem ocorrer melhorias, sim, como também pode ser palco de mais repressão, em todos os domínios da vida prática social. É claro que se deve ter em vista que isso pode extrapolar de tal modo e criar monstros. Entretanto, não é o caso presente do Brasil, que, pelo menos circunscrito ao campo da política, não corre o risco, não imediato, de criar um monstro sem precedentes. Mesmo assim, é interessante reiterar que toda a capacidade corrupta, propagandística etc., de nossa atual política é fruto de um processo histórico-cultural. Mesmo a luta por uma “outra forma de fazer política” – ou fazer seja o que for! – deve ser um protesto contra o processo histórico-cultural brasileiro, aliás, é quase que um apontar o dedo contra si mesmo em frente ao espelho. É, e deveria ser, algo reflexivo, que julga a si mesmo dentro de uma história e de uma cultura que, antes de tudo, é fruto de práticas cotidianas reificadas.
Dentro dos limites e regras do jogo, há alternativas. Não são revolucionárias na forma nem em conteúdo. Mesmo assim, para a vida cotidiana, imediata ou mesmo num mediatismo de curto ou médio prazo, podem trazer mudanças, se não substanciais ao menos relevantes. Essas alternativas, mesmo enformadas pelo status quo político reinante, representam as aspirações mais relevantes, ainda que de certa maneira “desconhecidas”, do povo. Porém, elas não chegam a ser postas em relevo pela própria forma do discurso e da democracia. Quando o processo político-eleitoral torna-se uma questão de propaganda, leva mais quem mais tem condições de assemelhar, em forma, tempo e conteúdo, sua propaganda política à das cervejas. Os partidos alternativos dentro do jogo, são quase que automaticamente relegados ao rebaixamento por não terem “patrocínio”, assim como ocorre no futebol. Representam, dentro dos limites propostos, alternativas reais à política mascaradamente oligarca na qual se insere o movimento da sociedade atualmente. Mesmo a ideia de “partido de massas”, “revolução proletária” etc., não fazer mais sentido prático atualmente, pelo menos em aparência, existe algo que deve ser levado em consideração.
As alternativas, no entanto, dependem altamente de um indivíduo minimamente autônomo e de uma, mesmo que também mínima, politização. Como ambas inexistem, quase que generalizadamente, são movidas, as alternativas, pela forma discursiva reinante. Claro que, por não possuírem escolha quanto a outro modo de ação, já que não há autonomia nesse âmbito, “optam”, mais por necessidade e obrigação do que por vontade, pela filiação à forma. Assim sendo, por serem inferiorizadas democraticamente deve fazer da propaganda o mote de suas caminhadas. Como nem aqui há espaço, dependem mais da  do indivíduo (algo de abstrato e absurdo) do que de sua politização. O que resta, nesse caso, é o que ficou na caixa após a sagacidade curiosa de Pandora, por mais que seja sem sentido e vazio quanto ao conteúdo.  
Ainda aqui, há algo que deve ser levado em conta. A  em candidato X ou Y, por não ser politizada, em alguns casos existe por conta de um suposto conhecimento, um coleguismo ou uma amizade, sobre fulano ou sicrano  além de motivos mais “bizarros” como aparência, suposto carisma, alguma fama etc.. Mas, e isso é claro, “negócios, negócios, amizades (e seja o que for) à parte”. Enquanto se levar em consideração mais elementos não-políticos do que elementos de fato políticos, o que há de mais vil assumirá o comando quase que irrestrito da sociedade. E talvez não seja falta de informação; antes, um bando de informações impertinentes, forjadas, falsificadas e irrelevantes, são postas em destaque, ocupando cadeiras que não são suas de fato ou de direito. Entrementes, para o indivíduo massificado, alienado, reificado, é mais cômodo “não se envolver praticamente” e, do alto de sua masmorra, gritar ao carrasco, ainda que preso aos seus grilhões, que a guilhotina não está corretamente afiada, do que se “sujar” na lama da realidade prática efetiva. Todavia, o que não se sabe, que a lama só é lama e só deixa de sê-la, assim que se cai nela com todo vigor e tenta-se moldá-la com as próprias mãos. Sem isso, ela nos envolve e transforma-nos em vasos de barro, inertes, tortos e receptivos de quaisquer mazelas que queiram nos entulhar.  

Salve do Marxist Urban Underground! 

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Incursões no mundo cotidiano: notas sobre o “Criança ‘Esperança’”

Chega nessa época do ano – e a cada ano o negócio começa ‘mais cedo’ – é incrível como a picaretagem com roupagem assistencialista se difunde. E, antes de qualquer coisa, é necessário ressaltar alguns aspectos que parecem isolados, mas são centrais: gente sorridente, tipos de gentes, esperança (qual tipo?), função social da propaganda, da assistência etc..
É interessante notar – é claro que é imprescindível ser ‘chato’, ter um olhar ‘meio-aguçado’ – como é seletiva a programação das mídias. Aliás, é necessário lembrar que essa programação é a da própria vida cotidiana da população. Desde os programas de pseudo-humor (que são racistas, homofóbicos, xenofóbicos etc.) – e ainda dizem que deve haver uma espécie de ‘licença moral’ para esse tipo de transmissão ideológica da dominação. É interessante que os ‘intelectuais pequeno-burgueses’ em suas afazia acadêmica e o senso comum concordam, e riem!, com isso –, então, desde esses programas aos enlatados humorísticos norte-americanos da primeira década, às novelas ‘cômicas’ e outras mais, existe algo de muito significativo. Toda vez que o assunto é pobreza ou mesmo sua suposta erradicação, o número de pretos extrapola a ‘cota’ pedida por lei para propagandas e comerciais em geral. Em alguns casos o próprio ambiente é ‘preto’, isto é, o nordeste, as favelas do Rio, de SP... Por outro lado, quando um programa, geralmente ‘gringo’ – exceção feita a alguns mais recentes, que não cabem no ‘estereótipo’ do que vem a seguir –, tem uma família majoritariamente preta, é, fato!, ‘humorístico’. Não precisa ir longe para constatar isso. Nos nacionais, o ser preto é usado[1] – isso mesmo: usado, com todas as letras!, e inclua-se aí os povos do norte e nordeste – em forma cômica. Isso indica, como já disse, algo significativo: a inferiorização estereotipada e eugênica. Tô pegando pesado? Não, com certeza não. Tudo o que teve início, aqui no Brasil, na era da Colônia, precisamente a partir de meados do século XIX em diante, ratifica-se hoje, no aqui e agora. Não me importa aqui, cabe ressaltar, compreender ou analisar alhures – o foco: Brasil. Enfim, o trato ideológico, racista e opressor, dado ao cotidiano – naturalizado, evidentemente –, é o que mais pesa; ideológico, não cínico. O ser preto não tem identidade. Isto é, sua identidade que tenta se criar por meio da negação[2], é sempre o motivo de seu ‘rebaixamento ideológico’. É por meio de sua resistência – ou mesmo por falta de sentido – que ele é colocado ‘no seu devido lugar’ (diria um reacionário do início do século XX... ou mesmo do XXI!). Incluso, está o ódio, principalmente da ‘nobre burguesia paulistana’, ao nordestino (entenda-se: nordestino = todo aquele que veio de algum canto do norte ou nordeste do país). A combinação perfeita é a imagem do preto, de cabelo crespo – invariavelmente desarrumado ou sujo –, roupas esquisitas, trejeitos sintomáticos, aparência de um primitivo, linguajar peculiar etc., e a imagem, conexa, do nordestino (‘baiano’, dizem). Não se precisa de exemplos; basta olhar para o lado, a qualquer momento do dia, que você ou o achará ao seu lado, ou em sua mente.
Dentro disso, por outro lado, há a figura do gay. É interessante também como é tratado. Caso seja um gay (no caso, um menino, homem) corriqueiro, da rua, ele é representado pelas mídias – e pelo senso comum – todo afetado, como se possuído por uma doença ou um demônio (e a demonização nem precisa ser dita, visto o crescimento do protestantismo em sua versão ‘populacho 2.0’ no Brasil, nos últimos 40 anos). Agora, se ele for branco e for da emissora hegemônica, aí é diferente: ele é ‘aceito’... (olha que bonitinho!). No caso das mulheres, o que parece ser melhor, é talvez pior. Ela pode ser gay, morar junto à outra, passear na rua sem, em sua maioria, ser agredida – ao menos fisicamente. Mas, há algo que pode ser pior que a violência física: a simbólica. Se ela tiver os ‘trejeitos não aceitáveis moralmente’, é logo submetida a algum tipo de ‘escrúpulo inescrupuloso’ (e isso me faz lembrar o “Clockwork Orange”).  Mas, não é disso que quero tratar.
Essa época do ano, principalmente quanto mais se avança para dezembro, o que vira para o chamado ‘brasileiro médio’ (e eu nunca entendi o que quer dizer exatamente esse médio, pois não muda p***a nenhuma) é o ‘senso de solidariedade’: todo mundo fica bonzinho; todo mundo torce contra a vilã da novela; em favor do amor entre os mocinhos; vibra com a ‘ajuda mútua’ – pois, diria alguém, é preciso ajudar o próximo. E, claro está, a maioria, de massificada que é, não percebe que a telinha fica mais preta. Pois, falar de pobreza, de sua erradicação, de ‘esperança para um novo milênio’ (escuto essa baboseira desde o final da década de 1980), de solidariedade com os ‘necessitados’ e algo mais, é falar, ou melhor, é transbordar preto da telinha. E a propaganda é incisiva: faz-se algo; e esse algo ou é treinar ‘criança macaco’ – pois as propagandas do “Criança Esperança” são com negrinhos pulando em chão de terra batido em alguma favela do Brasil –, ou dão violino e tambores para crianças tocarem em algum ‘projeto social’ financiado pela Unesco via “Criança ‘macaco’”. Por um lado, o problema está longe; por outro, a estereotipação mora ao lado, às vezes junto. E assim tira-se um peso do Estado; joga-se na mão do indivíduo isolado que ‘deve fazer sua parte’. Entra em jogo um intermediário chupim, com cara de ‘Esperança’ de um mundo melhor, mais ‘harmônico’ (talvez como as ‘harmonias’ de Schoenberg). Esse intermediário chupim tem um ‘testa de ferro’ como mecenas. E, irônico que deve ser, o mecenas é o ‘nordestino outrora estereotipado’; seu nome: Didi Mocó (e algo mais)! O que se perde de vista, e isso ficou claro hoje – hoje, digo, pelo menos para mim –, quando o clube esportivo da hegemônica midiática trazia estampado em seu peito o símbolo: “Criança ‘Macaco’”. O desvio de “capital público” – que vai além do dinheiro, envolve a vontade, as aspirações, desejos, posições políticas etc. de todo um povo –, a isenção de impostos, a corrupção das mentes e aspirações por meio de sua reificação (e isso é um dos momentos da ideologia burguesa) etc., tudo isso é ‘conquistado’ numa única jogada de ‘marketing’ – poderíamos dizer. Mas vai, também aqui, além do marketing. Todo o movimento do capitalismo, da supremacia burguesa, é como um ciclo. E esse ciclo precisa desse momento ‘solidário’ para se completar. E não se trata de uma posição ética; é uma opção política, um ‘ordenamento’ do capital.
Crianças pulando como macacos de galho em galho não justifica os milhões arrecadados. E mesmo que justificasse, não ratifica a prática de isenção social do Estado, tão pouco dos indivíduos que, até a solidariedade, terceirizam. É justificável apenas a um estamento: para a burguesia, que se privilegia com a reiteração da coisificação dos indivíduos. Quanto mais se preocupam – o tal do ‘homem médio’ – com suas medíocres existências e transmitem suas responsabilidades, sua práxis, para um mecenas abstrato (leia-se: “Criança ‘Macaco’”), mais o capital gira em falso alimentando a si próprio sem estorvo. A assistência social é prestada, sim. Mas não aos pretinhos ‘beneficiados’ pelo ‘projeto’. Ela presta ao capital em geral, à burguesia em particular; ao movimento da sociedade como ‘natureza’ ou ‘naturalização’ (“é assim e assim será para sempre”). A função social da propaganda é não distinguir entre o isso e o aquilo. É deixa-los à opção da autonomia do indivíduo, que pode, não obstante, escolher entre X e Y. E, concomitante, que não percebam que o alfabeto ideológico só tem uma letra (portanto, X e Y = 0). Quanto mais ‘macaquinhos’ pulam – enquanto nas propagandas de pastas de dentes, de planos de saúde, de ‘família feliz’ que come margarina e acorda sem ‘remela’ nos olhos, propaganda de cerveja etc., são gente ‘do bem’, ‘bonitas’, ‘modelos a serem seguidos’, em uma palavra, brancos jovens, ‘superiores’ pois perfeitos –, mais e mais a dominação dá um salto qualitativo.
Claro está, não é, como querem os ‘pensadores’ pequeno-burgueses, um ‘reflexo’ do que ocorre na sociedade, isto é, o retrato do cotidiano. É, sim, algo surgido e extraído do cotidiano e que repõe esse cotidiano; e esse cotidiano, já que reposto pela propaganda, em última instância, pelo capital, é um fragmento reificado do fetiche social. Essa conversinha “o povo que escolhe isso” é positivista, factual. Não é preciso lembrar que a leitura, aqui, é dialética.
Enfim, o “Criança ‘Macaco’” sempre será “esperança”, pois, se ela é a última que morre, o capital e seus mecenas a farão eterna, pois é ela que ratifica a prática picareta e dá aval para que a usurpação seja ‘legal’, ‘legítima’, em uma palavra, ‘solidária’. Enquanto houver crianças saltitantes e serelepes como macaquinhos que são ‘ajudados’ e tirados – segundo a bola de cristal deles – do mundo das drogas, da criminalidade (é, sim, pois, preto e pobre virará o que quando crescer – se crescer? Se não tiver um auxílio – assim como deram aos nativos daqui nos séculos XVI e XVII – a sociedade nunca irá para frente!), haverá, isso é certo, algo com que se preocupar. E, assim sendo, haverá algo com que desvirtuar ideologicamente e corromper – pôr outra(s) no lugar – o imaginário do senso comum, do ‘brasileiro médio’.

E, claro, revoltado sou eu. Temos sempre que ajudar o próximo. O individualismo egoísta é um erro. E o posicionamento político é só, como dizem, “sua opinião”...

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[1] Nem é preciso lembrar que o grande ícone do humor brasileiro nos últimos tempos é Mussum. E, claro: cômico, pois preto, cachaceiro, cheio de trejeitos, linguajar peculiar e outras coisas mais. Sua inferiorização marca uma geração, ou mais. Mas, como falar isso? Por que falar isso? “Ele era engraçado e ponto final!”, diria alguém. Assim como engraçado era ver 4 pessoas, de fato, engraçadas: o mais engraçado o já citado Mussum; seguido de um cheio de trejeitos “gays”, como o gay é representado; o outro, o líder – e o líder não pode ser preto, tampouco gay! – nordestino, também cheio de trejeitos (mas não gay, nem preto). E o quarto? Bem, o quarto – Dedé – um zero à esquerda: não era engraçado pois não tinha a ver com o que tem graça no Brasil; sem trejeitos, sem sotaque, sem ‘cabeça chata’, branco etc.. Por que ele seria engraçado? Nem ‘qualidades’ ele possui...

[2] Já tratei um pouco sobre a ‘identidade negativa’ em outro lugar. Cf.  http://dialogosdosubsolo.blogspot.com.br/2012/05/no-calor-do-momento-sobre-o-rap.html



Subsolo Urbano!

domingo, 13 de maio de 2012

No calor do momento (sobre o Rap)

[NOTA: Aqui, as discussões sobre o que vem a significar esse movimento no início do século XXI. Extraído de uma proposta de explicação, de meu entendimento, sobre minha "visão pessimista" e "intransigente" ao que constitui todo o movimento da realidade, afinal. Por mais que apenas um fragmento, a crítica está feita. O texto foi, como disse, extraído de uma discussão "no calor do momento", escrito à pauladas - e numa paulada só! - e se encontra, no mais, no Blog do meu amigo Igor Muller. Aqui o texto está reformulado; digo, está 'ajeitado', tirando os vícios de língua e algumas confusões mais. No que diz respeito à ideia central, está intocado. No mais, é apenas um fragmento crítico (assim como tudo que faço).]  

        O Rap é uma sequência de um processo histórico de contestação de uma realidade social específica que traz à tona os espólios e resquícios da escravidão nas Américas. Esse processo se inicia, no mínimo, com a guinada da música deixando os círculos burgueses e pequeno-burgueses no final do século XIX, quando surge algo para além do “espírito europeu” da música erudita e de uma gama de música popular feita por brancos e para brancos. Não se trata, como querem os ressentidos, de uma simples cor de pele; antes, de um conjunto de pensamentos e práticas sócio-históricas que divide o mundo entre o “nós” e o “resto”. Surge o Blues e o Jazz como música afastada, nos guetos (e é o que leva, entre outras coisas, Adorno a dizer que o jazz era composto por “lumpenproletariado”). No entanto, a simples expressão de pretos fazendo música já ia para além do quadro reinante. Não como simples contestação do racismo como problema histórico, mesmo que isso estivesse no bojo de um movimento nascente; além, de uma negação do dado e do estabelecido (e é esse o elemento que, em meu entendimento, Adorno não tem em mãos). Por mais que depois, assim como tudo, e principalmente com o nascimento e ascensão do Rock, o Jazz e o Blues tenham perdido força, a expressão da negação é e foi um germe que se desenvolveu conforme o movimento da sociedade. É claro que também posteriormente grande parte é engolida pela Indústria Cultural etc.. O Funk surge como a sequência disso: por mais que tenha sido algo mais “mainstream”, naquele momento se expunha como a negação por ser um elemento da resistência cultural dos pretos, que, não obstante, eram impedidos de vivenciar a cultura dominante. Com os movimentos da década de 1960, tanto os políticos, quanto os político-culturais – isso nos EUA – se inicia, em meu entendimento, o rap propriamente dito. Esteticamente, o rap deve ao Funk e ao Jazz. Politicamente, além desses, ao Blues. E o grande iniciador do que viria a ser o Rap no final da década de 80 e início da seguinte – tirando o fato que muitos consideram James Brown como o grande predecessor, por seus beats, seus gestos, seu modo de dançar etc. –, é Gil Scott Heron, com suas letras extremamente politizadas, nas décadas de 60 e 70. Isso influencia todo o mundo preto. O Funk e o Jazz e, especialmente, esse Funk ligado aos movimentos radicais pretos nos EUA, influenciam tanto os Africanos, quanto os Latino-americanos, em especial, Brasil.  
      Aqui entre nós, é o Samba de Morro e o Partido Alto que cria toda a imagem concreta da desigualdade, não simplesmente denunciando a desigualdade, mas “dando a cara à tapa”: “marginais” fazendo músicas para “marginais” e, com isso, construindo todo um legado de auto-afirmação negativa. Ainda na década de 70, o Movimento Black Rio se distancia da vigente Bossa Nova e da “música de protesto” da pequena burguesia carioca. Na junção Samba-Funk, expressava-se o legado originário do Samba de Morro e se colocava para além do “amor, sorriso e a flor”, que norteou os primeiros anos da Bossa, da zona sul. Era movimento que vinha na esteira dos movimentos pretos norte-americanos, com menor radicalidade política, mesmo assim, com o elemento negativo em seu núcleo. (Não se precisa falar, ainda assim, da influência de dois grandes músicos desse período, por claras que estão para todos: Tim Maia e, principalmente, Jorge Ben (sem o “Jor”)).

      Além disso, com os Bailes Blacks em 60 e 70, criaram, em SP especialmente, todo um enraizamento auto-afirmativo daquilo que, segundo o “colonizador”, deveria ter sido eliminado na Guerra do Paraguai e com a eugenia ultra-violenta – por isso o “negativo”: a própria existência de “marginais” é uma negação, não do racismo, mas do capitalismo enquanto sistema europeu. Nesses Bailes, aqui em SP, no final dos anos 70 e início dos 80 – Bailes que representavam alguma resistência, pois, entre outras coisas, eram locais onde pretos se sentiam “em casa”, para não dizer que não éramos aceitos nos círculos musicais brancos –, surge o “tagarela” (e isso os mais velhos dizem, além dos pesquisadores sobre o assunto): num dado momento, o baile parava para alguns “cantarem-falando” em cima das bases de Funk. Isso antes do surgimento “oficial”, no metrô São Bento. Na década de noventa, com a “abertura democrática” e o Brasil falido, as desigualdades sociais vinham à tona com toda força. Os resquícios de ditadura expressos na ROTA e os bairros periféricos “escuros” e esquecidos pelas “políticas públicas”, criou todo o cenário na qual o Rap se ergueria com força contestatória e negativa. (Basta ouvir qualquer coisa da década de 90, por pior que seja).

       O que quis dizer até agora, na tentativa de concluir essa parte, é que é um movimento, não-linear, de negação e, por isso, ficou restrito aos âmbitos negativos: os pretos e a periferia. Contudo, como sabemos, a partir do novo milênio, se efetiva com toda força o que Adorno e Horkheimer haviam dito na década de 40 (ou 50): o fetichismo da Indústria Cultural – e a consequente naturalização do estabelecido, a reificação etc.. Isso tudo aliado ao “way of life” tupiniquim que, entre outras coisas, se estabiliza com o aumento do “poder de consumo” do indivíduo-coisa. Os problemas sociais, que afetam a periferia não sumiram; antes, tomaram uma dimensão mais sutil (é mais ou menos o que Marcuse diz no Homem Unidimensional). E isso fez parecer que tudo estava resolvido. O Rap deveria (deveria no sentido de Dever-Ser dialético) evoluir junto à contradição do capitalismo, de forma negativa. Em meu ver, um dos poucos com alguma visibilidade que consegue esse feito (ao menos em parte) é o Parteum (e o Mzuri Sana, por consequência).

       O que ocorre com esse “pop-rap” dos Meninos da Augusta é que, entre outras coisas, o indivíduo agora é a imagem cômica e reificada do indivíduo do século XVI e XVII: aquele indivíduo autônomo que poderia suprir todas as suas necessidades através de sua própria Razão (é o que leva Kant a pensar no indivíduo atomizado racional e autônomo. Mas, antes, o que ocorre hoje é mais uma perspectiva kierkegaardiana do indivíduo mônada que se salva pela fé – não a cristã, em Deus, como queria Kierkegaard; diferente disso, na fé reificada no Capital fetiche, no consumo e no sobressair individual, como heróis mesmo, que “venceram na vida”). E isso leva ao “Rap do Eu”: Kamau é o grande representante. Veja: “Eu fiz isso, conquistei aquilo, fui por aqui, vim, venci” etc.. Ou, seus pupilos… O Criolo é um caso à parte. Ele de fato parece que pensa. Mas, para “vencer”, vendeu-se: veja os clipes e as letras (até aquela “não existe amor em SP” é de uma ambiguidade que me confunde). O Ferrez é outro enigma pra mim. Não sei se é um proletário intelectualizado que se tornou pequeno-burguês, ou se é um intelectual pequeno-burguês com vestes de periferia. Sei lá!

      Mas, o que digo – e isso começa com XIS na “Casa dos Artistas”, seguido de Helião no “Faustão”, os caras (não lembro o nome) que cantavam “… o boy de Cherokee” e aparecem de… Cherokee!!!, Mano Brown fazendo show em Balada de Boy, 200 contos pra entrar etc. – é que havia um projeto, individual mesmo, talvez na esteira de Sartre, que traçaram e almejaram: são, como quer Sartre, livres, e seus atos tinham uma finalidade. E é esta finalidade que obscurece a crítica, que alguns se furtam de criticar só pelo fato de serem os “meninos pretos”, dos “nossos”, que estão vencendo. O problema – um deles, pelo menos –, está que “venceram” como queria o projeto branco do capital. O vencer não passa de uma reificação e uma subsunção ao movimento mais autônomo do Capital Fetiche. (Aqui podemos tentar por no centro da crítica, em outro lugar, a ideia de Sartre sobre liberdade. É meio estranho para mim, ainda, mas é necessário pensar. Como disse, em outro momento, distinto desse).

       O que vale, em suma e grosso modo, é o vencer na vida, o indivíduo atomizado tentando se sobressair como se fosse o “radical” – e isso não é específico do rap (ou do pop-rap). Os problemas “sumiram”, e o rap – assim como os Movimentos de Esquerda etc. – perdeu o rumo, o “concreto” que negava. Não porque o concreto esvaneceu; antes, por que se sutilizou e se abstraiu: não se vê mais com os olhos nus. O grande problema é esse cinismo que diz ‘sou periferia, contra isso, contra aquilo’, que serve simplesmente para aparecer (assim como a Xuxa namorar o Pelé como trampolim para fama, por exemplo).

      A crítica a esse movimento é necessária para se entender, ao menos, um fragmento da efetividade social atual. Talvez na tentativa de não perder por completo o pensamento crítico, sua necessidade imanente. Isso na esteira de autores que ainda estou tentando me apropriar: Paulo Arantes, Safatle etc., que defendem, entre outras coisas, que a crítica se desfez, ou, como diz o título de Safatle: “falência da crítica”... Claro que o que afirmo e defendo aqui não esgota o assunto; antes, aponta alguns aspectos que me tiram do lugar cômodo e me põe em movimento retroativo de negação. É, em uma expressão, a decepção e o pessimismo vigente do séc. XXI que impulsiona para lá onde está a “outra ordem de verdade” tentada desde o séc. XIX.

      Voltando da digressão, reafirmando, o Rap se perdeu, pois se tornou pequeno-burguês, alienou-se das bases – é claro que há exceções, mas toda exceção é a alguma regra, portanto... (no mesmo momento em que vivemos em um grande estado de exceção, se pensando nas regras tradicionais que se esvanecem) – e seus fantoches se tornaram aspirantes a famosos, na tentativa de copiar os gringos do mainstream ou os periquitos verde-amarelos do way of life reificado tupiniquim... 

Salve do Urban Underground!

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Instrumental Brazuca: Capítulo I

Instrumental Brazuca: Capítulo I - set feito a partir de meus discos nas pick-ups do meu parceiro Dj Tiago
A cena: aniversário do Tiago, domingo de carnaval - o 'nosso' carnaval - churrasco, toca-discos, gente boa. O pedido foi para que preparasse um capítulo de 1 hora, mais ou menos. Na real, nem sabia quanto tempo havia no set (ainda não sei ao certo). Tirei os discos que queria da prateleira e fui colocando, um por um, anotando os sons, fazendo as sequências. 26 pérolas instrumentais. Meu primeiro "capítulo público" à partir de meus LPs. Resultado: um capítulo gostoso, bom de ouvir e tocar, só de sons instrumentais brasileiros, que vão da década de 1960 à de 1980. Por ter sido feito mais por fruição do que por sistema, saiu bem eclético, mesmo que limitado por algumas linhas fundamentais. Os discos, adquiridos, de uma forma ou de outras, com toda a paciência que um colecionador dessas coisinhas deve ter. A preocupação com o tempo ("ter tudo em um curto espaço de tempo"), para nós, some por completo. É um processo; Erfahrung, diria Walter Benjamin (o texto mais incrível do século XX: "Experiência e Pobreza"). Bildung! Um processo, talvez infinito, não muito calmo, cheio de intempéries, de acidentes... Contudo, o processo da vida vivida, que vai além das designações temporais do capital. É usar o tempo, simplesmente em si mesmo. Nada de valor, valor de troca ou seja o que for (por mais que a gente gaste muita grana comprando discos). É, em uma palavra, fruição, vida, experiência para além da pobreza moderna. 
E onde começa o nosso gosto, nossa pesquisa infinda? No berço! Uma parte da família nos lega por tradição, transmite-nos valores que só nós podemos saber seus efetivos, por mais que demoremos tempos para percebê-lo (novamente, o texto de Benjamin faz muito sentido aqui!). E onde começa a amizade? Há alguns anos (talvez 7 ou 8), exatamente, por conta desses gostos, das experiências que se entrelaçam, unem-se, somam-se e crescem juntas. Afinidades eletivas? Sim, sim. Ninguém se relaciona com o outro que não tenha nenhum aspecto convergente. Em minha humilde concepção de 'filósofo desanimado', a ideia dessa relação é abstração sem fundamento. 

Sobre os discos: Todos são de músicos brasileiros, alguns gravados aqui mesmo, outros fora do país; alguns só com músicos brasileiros, outros com estrangeiros (mesmo sendo os da pesada de lá). A real é que aqui, música, mesmo a popular, nunca foi valorizada, por nenhum dos âmbitos no qual poderia se concentrar. Até hoje, ouvir música brasileira de verdade é underground. Mesmo com a popularização e o retorno - mesmo que pálido - do vinil, essas coisas ainda estão circunscritas à nichos bem reduzidos. Enfim... Os discos são variados: têm Hermeto Pascoal num disco fantástico da década de 80; Quarteto Novo, de 67, com Airto, Hermeto, Théo de Barros e Heraldo Monte; Tom Jobim e seu Tide, de 1970, que dizem ser uma terminação do Wave, de 1967. Dom Salvador Trio, um disco também de 67 que, o original de época é uma mosca branca (o meu é uma reedição de 86); Roberto Menescal, Bossa Três, Milton Banana Trio, Manfredo Fest Trio, Jongo Trio e o Octeto de César Camargo Mariano, isso para dizer dos gravados no Brasil na década de 1960. Estes compõem a segunda parte do capítulo, no qual há uma guinada ao SambaJazz (quem me conhece sabe o quanto eu sou aficionado por isso!). Ainda há os sons de baile de Ed Lincoln, que, entre outras coisas e outros sons, mesmo dando outra guinada no final do set, foi necessário colocar essa música fantástica: Palladium, como fechamento. Há, na primeira parte do set, bastante coisa boa, gravada no Brasil ou nos EUA, de Airto Moreira, Eumir Deodato, o fantástico Donato-Deodato, e o fabuloso Moacir Santos e seu Saudade, original do Selo Azul. Além de uma edição Italiana do disco Summer Samba de Walter Wanderley (aliás, esse som foi usado pelo De La Soul em um sample no disco Stakes is High). Por fim, todos os discos conseguidos nessa busca de fruição, de prazer - além da reflexão -  e em direção à fuga do establishment da sociedade moderna. 

Bem, enfim, o capítulo é dedicado ao Tiago - e a sua família -, assim como foi no dia. E, também, à nossa busca incessante por cada vez mais sons, cada vez mais discos, cada vez mais prazer, não em ter, mas em poder viver isso, respirar melhor e aspirar coisas que, por maluco que seja, estejam na contramão de toda a "correria reverb" burguesa. Salve! 

Instrumental Brazuca: Capítulo I 

















      1. Spock na Escada - Hermeto Pascoal e Grupo [1984]
  2. Baubles, Bangles And Beads - Eumir Deodato [1972]
  3. Summer Samba - Walter Wanderley [1966]
  4. Carly & Carole - Eumir Deodato [1972]
  5. Remember - Tom Jobim [1970]
  6. Romance of Death - Airto Moreira [1973]
  7. Nightripper - João Donato & Eumir Deodato [1969]
  8. Vim de Santana - Quarteto Novo [1967]
  9. Whistle Stop -  João Donato & Eumir Deodato [1969]
10. Tombo in 7/4 - Airto Moreira [1972]
11. Misturada - Quarteto Novo [1967]
12. Aquela Coisa - Hermeto Pascoal e Grupo [1984]
13. Amphibious - Moacir Santos [1974]
14. Fala de Samba que Eu Vou - Roberto Menescal e Seu Conjunto [1964]
15. Tema pro Gaguinho - Dom Salvador Trio [1967]
16. Tema Bossa Três - Bossa Três [1963]
17. Centenário - Ed Lincoln [1971]
18. Oras Bolas - Milton Banana Trio [1965]
19. Quem é Homem Não Chora - Manfredo Fest Trio [1965]
20. Primitivo - Milton Banana Trio [1965]
21. Samblues - Octeto de César Camargo Mariano [1966]
22. The Blues Walk - Ed Lincoln [1964]
23. Balanço Nº 1Jongo Trio [1965]
24. Cidade Vazia - Milton Banana Trio [1966]
25. Noa... Noa - Milton Banana Trio [1965]
26. Palladium - Ed Lincoln [1964]



Salve do Subsolo Urbano!