[...] parece muito lógico, para não
dizer sagaz e, até certo ponto, louvável (mesmo que falte consciência do feito
para quem o fez e faz) que surja no cenário mundial um partido político que
tenha a alcunha REDE. Primeiro, pois num mundo onde todos (ou quase) parecem
ter acesso à tudo por meio de redes sociais variadas – no qual a própria vida
(ou o que dela resta) se tornou emaranha a tal ponto que naturaliza o enrosco –
e, além do mais, não se precisa tomar posição alguma já que não há posição à se
tomar, a não ser também se embrenhar nessa rede. Segundo, a ideia de rede se estende a tal ponto que, por
isso mesmo, isenta qualquer um de seguir um rito,
uma cartilha, um prognóstico e um programa claros
e consistentes – posicionados! –, também a isenção de seguir uma moral e uma
ética, mesmo que simplesmente descritiva e teórica, enfim, isenta ao mesmo tempo
em que concede espaço ilimitado para as maiores bizarrices sócio-políticas na
medida mesmo em que está acima e além (ou abaixo e aquém) de uma tomada de partido. Faz muito sentido, na
proporção em que cada um pode se “afiliar”, criar uma afinidade, pois, além de
um nome e uma figura que só para os sabidos é um “gato em cima do muro, pronto
a cair sempre para cima e em pé”, não se precisa, é claro, criar intrigas,
inimizades e etc., por "querelas politólogas". É como, para nós brasileiros comuns, torcer para luta
greco-romana ou para futebol americano: não entendemos nada e, exatamente
por isso, adoramos o espetáculo “inocente”, e nos compadecemos com ambos os lados,
achamos graça e tudo mais, no fim, saímos sorridentes pois nada nos afeta ou
nos muda (individual ou coletivamente), pois não nos diz respeito. No entanto,
mais além, a tal REDE faz o discurso “isento” e “imparcial”, típico da
pequena-burguesia com “espírito de gato” – só que gato vira-lata, pois muito
malandro – que se isenta pelo cinismo. E, é claro, agrega os à deriva (grande
parte de uma população incauta e despolitizada). Além de confundir
completamente os que estão à esquerda, já que o discurso “eco-qualquer coisa”,
da “sustentabilidade” (sic!) ou seja lá o que for, parece que não pode ser
contradito. Sim! Não pode ser contradito: ou você é humano (típico do séc. XXI,
portanto, desumanizado!) que se importa com árvores e tudo mais; ou é um outsider, um bárbaro em plena civilization e quer ver o fim do mundo o
mais depressa possível! Ora! O desenvolvimento sustentável já peca pelo termo: desenvolvimento, sinônimo de progresso,
de linearidade. Trai a si próprio pelo discurso superficial, enquanto beneficia
latifúndios e seus infortúnios, grandes capitalistas e fomenta ainda mais o
poder do capital, fincando-o com mais força no solo e nas almas. Se o capital
se torna “natural” em nossa época, lutar por uma sustentabilidade acrítica é
lutar pela sustentação plena do capital, da inumanidade, em última instância,
da morte!
Voltemos à Dona Marina. A REDE é o mais
democrático dos partidos: aceita qualquer coisa e qualquer um. É o signo expresso
da democracia e da libertè no
capitalismo tardio e na espetaculosa sociedade. A sagacidade disso deve ter
feito rodopiar Chico Mendes em seu túmulo. O discurso esclerosado da Dona
Verdinha é signo da esclerose social, do colapso de nossa época: une gregos e
troianos num mesmo cavalo de pau. Une todos os espíritos em torno de um mesmo
ideal – vazio, diga-se – e remove da política toda a cara de mesmice: une-a num
todo completo, no espírito absoluto de nossa época. O espírito inumano e
robótico que vê no mesmo o diverso e no diverso o mesmo. Tons e semitons soam
de uma só forma. A REDE é a maior sacada desses tempos no Brasil. É de uma
sagacidade imensa. É louvável o que D. Verdinha fez – louvável pela perfeita
picaretagem. Num mundo no qual todos querem estar associados a todas as redes, há, agora, mais uma mui
interessante para se emaranhar.
Subsolo!