sábado, 15 de junho de 2013

Todo ato de violência deve ser condenado!


Basta-nos saber o que é violência...


Violência é a estrutura de uma sociedade que oprime, a cada segundo mais, os mais pobres. E também oprime os mais ricos, pois o capital cria um padrão que anula a autonomia inclusive do burguês portentoso. Violenta é a forma como são tratadas as pessoas por si mesmas, como tratam os outros. Violenta é a forma como o Estado se diz democrático. Violenta é a “forma-sardinha” ao andar de ônibus. Violento são os míseros quilômetros de linha férrea de trens e metrôs numa das maiores cidades do planeta. Violento são os programas de TV (aberta ou não) que oprimem o cérebro. Violenta é a padronização da vida pelo consumo, pelo status. Violenta é a exploração do trabalho, o trabalho alienado. Violenta são as “ONGs”, sanguessugas sociais e cínicas. Violenta é a “pseudo-esquerda” que se perdeu desde 1989, e se tornou direita das mais ferrenhamente cínicas. Violenta é a direita que se transmuta em fascista. Violento são os programas “jornalísticos” ideológicos que adentram as casas dos mais pobres (material e espiritualmente). Violenta é a novela. Violenta é a fachada democrática das universidades, do conhecimento como semiformação. Violento é o cinismo que transforma todo tipo de preconceito e anulação das diferenças em “bullying”. Violento é o trocar educação das crianças por “bens” materiais – violento é o “responsável” por criança que troca educação, afeto etc., por “bens” materiais, por programas que padronizam, por falta de própria educação. Violenta são as propagandas direcionadas aos “jovens” consumidores. Violento é “formar” pessoas no ensino médio sem que saibam ler. Violento é o formar semi-indivíduos. Violência é falta de vontade para fazer coisas simples. Violenta é a não percepção dos nexos históricos de cada atitude aparentemente simples. Violenta é a redução da audição. Violenta é a redução do conhecimento à técnica. Violenta é a alternância da “segurança pública” entre capitães-do-mato e feitores. Violenta é a pequena-burguesia que finge refletir e só sabe atacar, como se fosse “crítica”. Violenta é a propriedade privada burguesa. Violenta é a proteção da propriedade privada pelo Estado. E também a primazia do capital sobre as vidas humanas. Violência é ser subjugado por tudo isso e ainda defender essa aberração. Violento é “ter opinião” como verdade absoluta. Violento é fingir ser politizado e não ouvir nada além do ego. Violento é não tomar posição e ficar em cima do muro. Violenta é a opressão. A manipulação. A anulação pelo poder. Violento, então, é o próprio “poder”. Violento é o medo, a paranoia social. Violento é a espionagem social que controla tudo por câmeras. Violento é concordar com isso sem o mínimo esforço. Violenta é a pena de morte autoproclamada pelos capitães-do-mato nas periferias. Violenta é a posição política que se embasa na vingança pessoal e arbitrária. Violento é dizer de algo que é “público” e excluir o “público”, concomitantemente. Violento é o rumo que a vida toma na “calmaria” da hipóstase, da servidão. Caso contrário, não

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segunda-feira, 10 de junho de 2013

A inumanidade da existência cotidiana: puxadinhos, modernização, especulação, exclusão


Meu avô, analfabeto de tudo – assim como minha avó, diarista –, graniteiro (profissão que hoje nem existe mais), paraibano, comprou um terreno pequeno, na periferia, em fins da década de 1950. Num lugar, até a década de 1970, ermo, sem asfalto, sem luz na rua (iluminação pública), sem rede de esgoto, onde se abriam poços nos quintais para ter água. E isso ocorreu em e para muitas e muitas famílias até a década de 1980 (com algumas alterações). Lembro, ainda pequeno, nos fins da década de 1980 e início da seguinte, que os poços começaram a ser fechados: jogava-se tudo dentro dos buracos para tentar fechar; quanto mais jogava, mais cedia. Não, não estou falando do sertão da Paraíba ou de algum lugar longínquo: é São Paulo, capital. Exatamente, a periferia distante do centro – agora, por conta de variados aspectos, nem tão distante. Isso tudo para quê? Para que dizer tudo isso?
A criação histórica das periferias, das favelas etc., é – grosso modo – fruto de um processo de marginalização dos “indesejados”: pobres, pretos, nordestinos e nortistas retirantes... Naquele período, por vários motivos, era, até certo ponto, “fácil” adquirir um terreno e construir um cômodo ou dois que não ocupava nem um quarto do terreno. Mas era o que dava. Só no decorrer do tempo a casa ia aumentando, por conta da necessidade prática (família que crescia, agregados, casamentos dos filhos, “puxadinho”, economias de anos para ampliar certo tipo de conforto etc.). – Em tempo: os cômodos mais antigos aqui, os dois dos fundos, são feitos, por completo, de “barro”: tijolos de barro superpostos e “colados” com uma mistura de barro e argila, coisa comum “antigamente”. Os conjuntos habitacionais também proporcionaram moradia para essas pessoas. É claro que dependeu de luta por parte de movimentos sociais por habitação etc..
A “cultura dos puxadinhos” se deu por uma necessidade prática, não somente, ou não exatamente, por conta da ampliação das rendas. Com o raio estrondoso da globalização (ou do “globalitarismo”) atingindo as periferias transmutado em consumo massivo, as necessidades (ou falsas necessidades; necessidades impostas), crescem vertiginosamente. Uma ânsia por modernização atinge o coração das pessoas mais simples. Era necessário que se fomentasse algum tipo de inserção das periferias no mundo, de forma plena (ainda que coisificada). Isso é visto, a partir dos anos 1970, por conta do acesso direto ao centro por “ampliação” do transporte público urbano (que ainda é uma ampliação de fachada e mal feita). Além disso, essa inserção também se dá no plano espiritual: fazia-se imprescindível que o consumo de tudo, a cultura do acesso, a vida como um todo, se assemelhasse àquela vista e implantada no inconsciente pela grande mídia. Toda a falsa necessidade do capital leva em sua torrente revolta toda a simplicidade da vida anterior e, por extensão, cria um padrão ideal a ser seguido e, quiçá, alcançado. Toda a “modernização” que, na década de 1990 e nas seguintes, fazia coisas brotarem do chão (supermercados, lojas de todos os tipos, todo tipo de comércio formal e “ambulante” etc.) – acarretando, entre outras coisas, o fim dos terrenos baldios que serviam de campinho e outros, e também o fim dos campos de futebol de várzea, as áreas de “lazer”, que não passavam dos mesmos terrenos baldios e etc. –, fez o tal do “custo de vida” subir vertiginosamente. Aquelas famílias que chegaram aqui entre 1950 e 1980, que, como era costume, possuíam filhos à rodo (de dois à quatorze ou mais), só podiam – ou o espaço só comportava – um “puxadinho” para o que primeiro casasse ou para o mais velho. Em alguns casos, os puxadinhos fizeram os terrenos e casas de outrora virarem cortiços familiares, no qual se comportavam várias famílias (geralmente de mesma matriz matriarcal ou patriarcal) num mesmo quintal. Casebres de um cômodo ou dois amontoados num espaço pequeno.
A “modernização”, a inserção das periferias ao mundo globalizado (“capitalizado”), fez, ainda, com que a especulação de todos os tipos, principalmente a imobiliária, se estendesse e se instalasse com toda força por aqui. Aqueles que nasceram na década de 1980, principalmente, não tiveram (e não têm; e não terão) espaço no mesmo terreno de seus pais: ou porque seus pais já se situavam num puxadinho de seus próprios pais, ou porque já haviam cedido espaço para os outros filhos etc.. Teriam, com toda força do acaso, que fazer suas vidas sozinhos. Os resultados foram a criação de outras periferias ainda mais distantes do centro. O problema é que toda essa “expansão” da cidade não se deu como outrora, como se os que foram mais para o fundo fossem bandeirantes: eram excluídos e, além do mais, duplamente excluídos na medida em que o desenvolvimento do capital, do assalariamento – os empregos em massa – continuava concentrado no centro da cidade. O que os geógrafos chamam de “cidades dormitórios” ou “bairros dormitórios”, pode ser visto sem muito esforço. Aqueles que no período anterior eram assim (bairros dormitórios), agora se tornaram – e continuam com vento em popa! – bairros de classe média. Os trabalhadores (mesmo aqueles “qualificados”) ou se enforcam numa dívida eterna (sem superlativos!), ou, por outro lado, fogem sem escolha para margens ainda mais distantes. E estas extrapolam as margens geográficas da cidade, em muito.
Essa “modernização” das periferias é algo, por si só, contraditório: faz o local o mais habitável possível e, ao mesmo tempo, expulsa seus antigos habitantes. Ora, a chegada do metrô em muitos bairros é algo esperado por muitos há mais de 30 ou 40 anos. Agora que chega, essas pessoas devem sair, pois não conseguem arcar com as “consequências” e mazelas desse desenvolvimento. Agora que teriam garantido acesso rápido ao centro e tudo mais, o mesmo espaço é tomado pela nova classe média, ou pela antiga classe média decadente. Além, as empreiteiras – sanguessugas especulativas do capital – e os especuladores imobiliários, aproveitam-se da “oportunidade” criada e saem desvairados pelas ruas das periferias comprando casas antigas, com terrenos com, em média, 10X25, derrubam tudo e constroem, no mesmo local, “becos” – 3 ou 4 – que chamam de casa, geminadas, e vendem cada uma por um preço superior ao que foi pago no terreno e casa que compraram. Mais ainda, os edifícios construídos (chamam de “condomínio”), são cada vez menores, não o edifício em si, mas os apartamentos. Apartamentos que chegam a medir 40m², vendidos à preço de ouro, chegando a custar, à vista, mais de 180 mil. Nas prestações a perder de vista, no mínimo o dobro. Apartamentos maiores (aqueles que chegam a caber, apertado, um sofá de 3 lugares) são “luxuosos”: ou se desembolsa meio milhão em prestações, ou nada feito.

Enfim, duas conclusões (ou algo desse tipo) são possíveis e se interligam. O desenvolvimento do capital é contraditório por si só e consigo mesmo. Isso acarreta uma morte lenta e sofrida para alguns, uma morte instantânea para todos. Por outro lado, se é doutrinado para que não se revolte com a situação insuportável engendrada em altas doses na veia que, se por um lado mata, por outro alivia de algum modo esquisito, atordoante e inconcebível. E inconcebível pensar que ainda se mantém sem uma convulsão prática profunda. Perdeu-se a capacidade de sonhar para além do que é exigido: ganhou-se uma outra capacidade de sonhar. A proliferação das igrejas e dos botecos, entre outras coisas, tem relação direta com isso: é necessário algum tipo de alento imediato que aja em dois âmbitos: na aceitação desse estado de coisas insuportável por si só, e na busca ilusória para se inserir nesse mesmo estado de coisas insuportável. Não há explicação plausível e não contraditória dessa situação. Se Marx dizia que o trabalhador assalariado “ganhava” o “suficiente” para se manter (ter casa – mesmo que alugada –, comida, roupa e que conseguisse reproduzir), ele não tinha noção do que a segunda metade do século XX iria criar. E se a situação mais escabrosa poderia criar algum tipo de “consciência revolucionária”, de fato, ela criou algum tipo de “consciência”: a do medo, que engendra a fuga, que é fomentada pela ideia de fracasso individual, que faz retornar com mais força e sede de inserção. E isso conseguirá permanecer insustentável por mais quanto tempo?  
Subsolo (pois só o subsolo restará!)!

sábado, 8 de junho de 2013

Pequenas Coisas


As pequenas risadas. Os sorrisos. A amizade cúmplice. A amizade simples. O pôr-do-sol. E também o nascer. A garoa fina. As folhas secas. E também as flores desabrochadas. As pequenas lágrimas, escondidas, de alegria e de tristeza. O renovar por meio delas. Cada segundo da existência bem existida. As viagens com Goethe, Dostoiévski... com Benjamin. A simplicidade da luz do daion. As coisas velhas e bem guardadas. Coisas antigas... As pequenas lembranças, pois todas são bem pequenas e gigantes pela apreciação de cada uma, pela renovação e pela reelaboração de cada uma. Os pequenos chistes de infância. As andanças com a cabeça longe... As histórias dos mais velhos. As histórias dos antigos. Os apuros passados juntos, e também os que ninguém sabe, que se passou só... A comida da avó. Os abraços. O cheiro do café, da terra após a chuva. As noites mal dormidas pela ansiedade. As fotografias granuladas que possuem, cada uma, uma história completa e incrível. O retorno a algum lugar que há muito não se ia. Anos de memórias boas que revivem... As noites com brisas quentes do mar, olhando para o infinito, pensando em tudo, em nada. As pequenas conversas. Aquelas que se fazem à luz da lua. As que fizeram tudo ter outro sentido. O demorar-se numa ideia, às vezes sem sentido. Os banhos de descarrego. As histórias de terror quando faltava luz... Os medos de infância. As minúsculas alegrias que se perderam no tempo. Os sorrisos que ficaram para trás. Os passeios mais singelos. A despreocupação com o tempo. Os conselhos de mãe...

As pequenas coisas que se esquecem, que se vão. Que revivem, rememoram-se... Aquelas que, num ato messiânico, utópico, romântico, poderiam salvar o mundo, salvariam as existências individuais. As mesmas que, perdidas, fizeram as relações congelarem, tornarem-se frias “desemoções”, descabimentos... Que tornaram a técnica a confluência e ponto necessário e teleológico de toda vida. Que suprimiram o tempo, aquele mesmo que cria a memória, que guarda tudo que poderia dar sentido à existência individual. As pequenas coisas simples que, não existindo mais, tornam a vida danificada. Transformam a vida em algo objetificado, e o objeto, por sua vez, aquele que toma posse irrestrita da vida. A perda do sentido das emoções, sendo elas apenas um produto já mastigado, posto pela técnica, pela “techno logos”. Pequenas coisas que se esquecem, que se esfacelam no tempo suprimido, que se perdem. Que não voltam. Que podem reavivar, mas...  

Subsolo Urbano! 

[Ouvindo: Ronnie Laws - Night Breeze]