... a grande questão é: quem não é intelectual?
1.
Talvez a questão do cogito cartesiano não tenha sido bem explicada. O simples fato do “eu
penso” já traz em si, na própria ascensão, o ocaso do indivíduo moderno:
qualquer um pode pronunciar um “eu penso” aos quatros quantos. O ato de pensar
se aplica, irrestritamente, a todos em relação a tudo. É um dado, inexorável e
que não carece de argumentação: “eu penso” – axioma irrefutável.
2.
A ideia de uma “esfera pública”, na qual
o debate se dá de forma “livre”, não implica que qualquer um possa dela
participar: mesmo Habermas já coloca o adjetivo, não por acaso, “burguesa”: é necessária
formação cultural... Mesmo que reificada
em si mesma, e seus participantes também reificados, a esfera pública pressupõe
o mínimo domínio – ainda que alienado e circunscrito ao universo estabelecido,
ao Telos dominante. Por outro lado,
uma esfera pública não-burguesa pressuporia a experiência material das
contradições. Tanto esta quanto aquela não se dão mais, a não ser como sombra,
como “aparência objetiva” da “coisa dominante” (capital em sua forma espiritual-abstrata):
reprodução fiel e insensata.
3.
E não é que já Adorno dizia sobre a semi-formação? Já que a “formação” se
daria como produto da indústria cultural, da produção da sociedade alienada de
si mesma, não haveria espaço mais para uma “formação” em sentido lato. Aliás,
parece que o que há é a não-formação que aparece como seu oposto diametral:
formação espontânea, como que por mágica, divina, nata. Mas só como aparência.
Tal “formação nata” é a reprodução mais fiel da própria dominação, inclusive
daqueles que pensam que “pensam”.
4.
A Filosofia, no sentido clássico, é
abstrata em demasia. O filósofo, no sentido moderno – isto é, o “diplomado mas
não-pensador” –, esquece-se da filosofia, exatamente por conta de seu modelo
abstrato, no momento oportuno de efetivar seu conceito, na contradição,
retirando-o do movimento abstrato do espírito: só profere parvoíces, bobagens,
reproduz o senso comum com aparência de um “nível” mais elevado...
5.
Todo mundo pensa; todo mundo sabe de si
e de todos; todos sabem do si e não se sabem a si mesmos. A verdade está aí, na
cabeça dos intelectuais, esperando o momento exato para se efetivar: Adorno
dizia, o momento da efetivação passou – não para esses sábios... A verdade, aliás, está no fato fragmentado, naquele que pode ser “compartilhado” de pronto:
sem reflexão, sem contexto e contextualização. O “fato” refletido, pensado e
recolocado em seu contexto de origem é sem graça: maçante... O que pensa: pedante. O que acha que pensa: intelectual.
6.
A verdade, ainda, é explícita: está na
pseudo-reflexão daquele que diz a si mesmo que sabe: reproduz. Está, além do
mais, nua e crua na frente do espectador: só
há espectadores. Ela, por fim, depende da reificação do si imposta ao
objeto: contrariamente a Adorno, primazia
do indivíduo-coisa.
7.
O Silêncio dos Intelectuais – aqueles mesmos
que são o que são – faz sentido: não há objeto a ser pensado, refletido; há fatos,
estão todos aí, e os fatos não os servem, aliás, não servem a ninguém, por mais
que aqueles outros, os “Intelectuais”, se achem no direito legítimo da crítica.
Qualquer contraposição a estes é revertida em ad hominem, ponto final.
Subsolo Urbano!
no play: Milton Nascimento e Lô Borges - Clube da Esquina [1972]
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