quarta-feira, 16 de abril de 2014

“Intelectuais”

... a grande questão é: quem não é intelectual?
1.      Talvez a questão do cogito cartesiano não tenha sido bem explicada. O simples fato do “eu penso” já traz em si, na própria ascensão, o ocaso do indivíduo moderno: qualquer um pode pronunciar um “eu penso” aos quatros quantos. O ato de pensar se aplica, irrestritamente, a todos em relação a tudo. É um dado, inexorável e que não carece de argumentação: “eu penso” – axioma irrefutável.
2.      A ideia de uma “esfera pública”, na qual o debate se dá de forma “livre”, não implica que qualquer um possa dela participar: mesmo Habermas já coloca o adjetivo, não por acaso, “burguesa”: é necessária formação cultural...  Mesmo que reificada em si mesma, e seus participantes também reificados, a esfera pública pressupõe o mínimo domínio – ainda que alienado e circunscrito ao universo estabelecido, ao Telos dominante. Por outro lado, uma esfera pública não-burguesa pressuporia a experiência material das contradições. Tanto esta quanto aquela não se dão mais, a não ser como sombra, como “aparência objetiva” da “coisa dominante” (capital em sua forma espiritual-abstrata): reprodução fiel e insensata.
3.      E não é que já Adorno dizia sobre a semi-formação? Já que a “formação” se daria como produto da indústria cultural, da produção da sociedade alienada de si mesma, não haveria espaço mais para uma “formação” em sentido lato. Aliás, parece que o que há é a não-formação que aparece como seu oposto diametral: formação espontânea, como que por mágica, divina, nata. Mas só como aparência. Tal “formação nata” é a reprodução mais fiel da própria dominação, inclusive daqueles que pensam que “pensam”.
4.      A Filosofia, no sentido clássico, é abstrata em demasia. O filósofo, no sentido moderno – isto é, o “diplomado mas não-pensador” –, esquece-se da filosofia, exatamente por conta de seu modelo abstrato, no momento oportuno de efetivar seu conceito, na contradição, retirando-o do movimento abstrato do espírito: só profere parvoíces, bobagens, reproduz o senso comum com aparência de um “nível” mais elevado...
5.      Todo mundo pensa; todo mundo sabe de si e de todos; todos sabem do si e não se sabem a si mesmos. A verdade está aí, na cabeça dos intelectuais, esperando o momento exato para se efetivar: Adorno dizia, o momento da efetivação passou – não para esses sábios... A verdade, aliás, está no fato fragmentado, naquele que pode ser “compartilhado” de pronto: sem reflexão, sem contexto e contextualização. O “fato” refletido, pensado e recolocado em seu contexto de origem é sem graça: maçante... O que pensa: pedante. O que acha que pensa: intelectual.
6.      A verdade, ainda, é explícita: está na pseudo-reflexão daquele que diz a si mesmo que sabe: reproduz. Está, além do mais, nua e crua na frente do espectador: só há espectadores. Ela, por fim, depende da reificação do si imposta ao objeto: contrariamente a Adorno, primazia do indivíduo-coisa.

7.      O Silêncio dos Intelectuais – aqueles mesmos que são o que são – faz sentido: não há objeto a ser pensado, refletido; há fatos, estão todos aí, e os fatos não os servem, aliás, não servem a ninguém, por mais que aqueles outros, os “Intelectuais”, se achem no direito legítimo da crítica. Qualquer contraposição a estes é revertida em ad hominem, ponto final. 

Subsolo Urbano!

no play: Milton Nascimento e Lô Borges - Clube da Esquina [1972]

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