De
tudo que é efêmero, o mais palpável é o sentimento da morte. É o mais palpável
e, contraditoriamente, o mais fugaz, esfumaçado. Todo prédio que cai leva
consigo um pedaço da persistência. Não a persistência do concreto: a
persistência do tabu. Nada fica, nada teima em permanecer e cumprir seu papel.
De tudo que estava, nada havia que tenha permanecido, que não tivesse já o
destino da fumaça. Estava, pois as
coisas apenas estavam. Estavam, pois
a coisas nunca mais se deram no presente. O luto, que deveria cumprir seu papel
psíquico, persistir e alterar a configuração do todo pelo momento, é tabu: “tabu não é morrer; tabu é a morte”.
Esta mesma que se esmaga, que se esvai na abstração do que valia mais: o higienismo e sua reprodução massiva na
profusão sempre-igual dos milhares de discursos, ou a transferência da culpa, ela em sua disseminação vazia que só revela
o que tem dentro dos indivíduos – o que
tem dentro, não a interioridade.
E o que se tem dentro passa de reprodução? Mas, reprodução de quem, de quê?
Pouco importa. O luto não persiste, tampouco cumpre seu papel: a face humana da
morte morreu antes dela mesma.
Vários
tiros ou o corpo arrastado em via pública – ou o corpo sumido por instância
pública... Nada vale. E mesmo se valesse, valeria como mercadoria. O paradoxo
está dado: valer ou não valer, that’s the
question! E não se culpe o outro, bourgeois
ou citoyen. A efemeridade é
doença também do “crítico”. O anjo da
história olharia para frente – duplamente atônito: o passado já não está
mais atrás das costas. “Tabu não é
morrer. Tabu é a morte!”
*
* *
Estado de
exceção?
Quando? Onde? Quem não sabe definir, define. Só com uma mordaça se poderia
definir exceção – ou sem ela, tanto faz. Quanto menos exceção, quanto mais
naturalidade em tudo, mais exceção. O Estado de exceção não é poder não falar;
ao contrário, é falar só o que se pode – e o
que se pode nem sempre é identificável imediatamente. A “seriedade bovina”
é mais realização da exceção que a mordaça.
*
* *
Dia
05 de maio. Quem ainda lê Marx é um gênio – leitor gênio de gênio. E ser gênio
não é para qualquer um. Tanto é que ele, há 150 anos, passava 10 horas se
esfolando com os livros na biblioteca pública de Londres – menos aos domingos,
quando passeava com as filhas, aquelas mesmas para quem lia toda noite,
Shakespeare de preferência, antes de dormirem. O primeiro rascunho sério de O Capital, os Grundrisse, datam de 10 anos antes da primeira edição do volume 1
do dito cujo. Gênio! Gênio? Será? Fôlego, paciência, persistência, Trabalho – com T. Quem define o gênio nunca foi
leitor seriamente. Quem se define gênio nunca se deu conta que o cosmo não é o
próprio umbigo – ou o eu, que dá no
mesmo.
O
sujeito mais difamado de, pelo menos, 150 anos para cá, teve e tem poucos
leitores que o levaram a sério. Parvoíce und cretinice! Sim, é assim que se
define. Pois crítico é quem lê, interpreta, sua em cima do texto e do
pensamento. Quem difama – consequentemente sem ter lido nada além da capa, nem
orelha! – não pode ser dito crítico. Gênio? Risos. Viva os 200 anos do primeiro
crítico sério da banalidade sistematizada. Luto ou festejo? Pouco importa: dia
06 ninguém mais se lembrará de nada.
*
* *
Um corpo que
cai – só em Hitchcock!
Reprodução à exaustão. Discursos efusivos. Os “sensíveis” fazem o mesmo jogo
dos brutos: quem entra na ciranda tem de cirandar. Quem fez a ciranda? Só a
abstração sabe. Efusivos, parvos, títeres. Quem entra na roda, roda. E como
roda. O jogo não se supera com gol, mas com a superação do campo. Se um corpo
cai, um espírito deveria se cindir. Mas o verbo no futuro do pretérito anula
desde antes a ação. O corpo cai, se desfaz no concreto armado em fogo. O
concreto? Só a abstração dominante prevalece. Alguns chamam pelo nome da
mediação, obliquamente: especulação. Outros criam todo tipo de “teoria” –
reprodução? – para justificar seus próprios eus. O que fica... bem, o que fica
é o que antes já estava: pouco importa o que se deu. Mesmo os daqui – os “sensíveis” – justificam a barbárie –
basta ver os perfis sorridentes que em luto permanecem sorridentes. “Morrer não é tabu. Tabu é a morte”. A
forma mercadoria permanece igual e faz o meio de campo de tudo: ela produz,
também, a sua forma de consumo – frise-se: ela produz – o resto é predicado quase banal. Tabu? É a morte!
Subsolo!
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